quinta-feira, 19 de março de 2015

UMA REFUTAÇÃO DA INTERPRETAÇÃO DE WILLIAN CRAIG SOBRE ROMANOS 9






O texto de Romanos 9 traz um incômodo contundente àqueles que aderem à doutrina arminiana ou semipelagiana. Por isso, é muito comum ter nos sites e blogs arminianos textos que tentam interpretar Romanos 9 refutando o que eles dizem a “interpretação reformada”.

O site “Pentecostais Verdadeiros” teve o cuidado de expor a refutação de Roger Olson a uma afirmação de John Piper que, segundo ele, John Piper, ao ser questionado se algum teólogo arminiano o influenciou em algum momento da sua vida, respondeu que nenhum teólogo arminiano o influenciou, pois “eles têm uma exegese decepcionante”.

Eu tenho o mesmo ponto de vista do Dr. John Piper. Os teólogos arminianos têm uma exegese completamente deficiente e, facilmente, um estudioso atento pode perceber e demonstrar isso.

O site Ministério Apologético colocou um texto de autoria de William Lane Craig respondendo a questionamentos de um jovem ateu que inclui o texto de Rm 9. O Dr. Craig é um bom apologista, mas tenho que admitir que quando o Dr. Craig vai para as Escrituras, nesse assunto, demonstra uma total inabilidade exegética ratificando o que o Dr. John Piper afirmou.

O Dr. William Lane Craig tenta responder a um jovem ateu por nome Darrin que o escreveu de uma forma muito sincera sobre alguns problemas que ele tinha sobre a existência de Deus. O primeiro problema lida sobre a ressurreição de Cristo que não vou tocar, pois nisso andamos juntos e a sua reposta foi bem satisfatória. No entanto, a segunda dificuldade do jovem ateu, Darrin, deixou-me impressionado com a sua visão do texto. É nessa resposta que me dedicarei para demonstrar a distorção de alguns aspectos exegéticos que não foram levados em conta no texto do Dr. Craig.

O que me impressiona é que o ateu coloca, como uma dificuldade, o caráter de Deus e usa o texto de Romanos 9 e João 6.65 para afirmar que Deus, segundo ele, é “tirânico e indigno de adoração e de fato é difícil para alguém de fora da fé responder à interpretação calvinista de Romanos 9 com algo menos que ódio”. O mais interessante é a seguinte declaração do ateu: “Muitos reformados pensam que esta passagem mostra a dupla predestinação e a eleição incondicional, e sou forçado a concordar com eles – como também Cristo em Jo 6.65!”.

Ele colocou a dificuldade do texto quando Paulo afirma em Rm 9.17: “‘Eu o levantei exatamente com este propósito…’ e então discute a ideia que os vasos que Deus fez para ‘uso comum’ existem somente para o propósito de mostrar sua paciência aos seus vasos mais especiais.”

O jovem ateu admitiu sobre o texto o que qualquer pessoa honesta intelectualmente, que tenha um certo conhecimento de leitura, literatura e lógica linguística chegaria: o texto diz o que realmente ele quis dizer – Deus é totalmente soberano em sua salvação.

A resposta do Dr. Craig passou por vários problemas que gostaria de destacar:

O Dr. Craig responde esse segundo questionamento dizendo que:

devido à teologia reformada, temos a tendência de ler Paulo como que limitando o escopo da eleição de Deus a uns poucos escolhidos, e aqueles que não foram escolhidos não podem reclamar se Deus em sua soberania os despreza. 


Ele conclui dizendo que acredita que é uma interpretação equivocada do capítulo que não leva em conta o contexto da carta. No entanto, percebe-se que quem não levou em conta, não só o contexto da carta, mas o contexto imediato e a analogia das Escrituras foi o Dr. Craig como vou demonstrar nesse texto.

O Dr. Craig não levou em conta que quem limita o escopo da eleição não são os reformados, mas a própria Bíblia. Há duas grandes evidências sobre isso: a exegética e a textual com analogia de outras passagens.

A evidência textual e etimológica:

O Verbo grego usado para “eleger, escolher” é ἐκλέγω. Esse verbo é um composto de duas palavras: a preposição ἐκ “sair de” mais o verbo grego λέγω, “falar”. Implicava em escolher algumas pessoas de um determinado grupo apontando. Por isso a preposição ἐκ na etimologia da palavra. Portanto, quando se afirma que essa palavra é usada para “escolher a todos”, está fazendo a declaração mais patética que se possa ver ou ouvir.

Esse verbo é usado cerca de 19 vezes no NT, e todas as vezes que ele é relacionado à Igreja ou aos convertidos jamais quis demonstrar uma escolha de todas demais pessoas.

Os textos que são usados para outras escolhas, todos eles demonstram que a escolha não inclui o todo, mas escolhe-se DE um todo. Por exemplo:

Luke 10:42  2 Entretanto, pouco é necessário ou mesmo uma só coisa; Maria, pois, escolheu a boa parte, e esta não lhe será tirada.

ενος δε εστιν χρεια μαρια δε την αγαθην μεριδα εξελεξατο ητις ουκ αφαιρεθησεται απ αυτης

Notemos que την αγαθην μεριδα está em completa ênfase demonstrando o que Maria escolheu εξελεξατο, que era estar com Cristo em vez de ajudar sua irmã.

Portanto, quando o Dr. Craig e os arminianos afirmam que a eleição inclui todas as pessoas, eles estão colocando em vulnerabilidade a capacidade exegética, lógica e cognitiva deles.

Imaginemos que um professor dissesse em uma sala de aula: “eu resolvi escolher da sala quem deve fazer a minha prova no próximo mês!”. Os alunos ficariam perplexos esperando o professor falar os nomes. Depois, o professor fala: “eu escolhi todos vocês”. O mínimo que aconteceria era que a turma toda riria desse professor ou pensaria que ele tinha um raciocínio deficiente, e se ele continuasse a defender isso, seria diagnosticado como esquizofrênico. Como alguém que diz que vai escolher o todo? Isso seria completamente redundante e patético.

Ou imaginemos que toda a mídia apreensiva esperasse o técnico da Seleção Brasileira dizer os nomes daqueles que iriam fazer parte dos jogos da Copa. Ele senta na cadeira e afirma: “eu escolhi todos os jogadores”. Os repórteres ficariam da mesma forma quando um calvinista lê ou ouve de um arminiano que afirma que Deus escolheu todos para a salvação. Realmente é de sentir dó!

2. A evidência da analogia das Escrituras

A segunda evidência que temos é a mais contundente, pois fala da analogia das Escrituras que é um princípio básico da Hermenêutica, ou seja, a Bíblia interpreta a própria Bíblia.

Comecemos pelo VT:

Isaiah 41:8-9   8 Mas tu, ó Israel, servo meu, tu, Jacó, a quem elegi, descendente de Abraão, meu amigo,  9 tu, a quem tomei das extremidades da terra, e chamei dos seus cantos mais remotos, e a quem disse: Tu és o meu servo, eu te escolhi e não te rejeitei,

O profeta Isaías está se referindo ao povo de Israel, pois Deus personifica esse povo chamando-o de “servo meu”, Israel e Jacó, pois eram descendentes de Abraão, Israel e Jacó. No texto, Deus fala que escolheu o seu povo de todos os povos da terra. O verbo hebraico בהר bachar está no qal perfeito que quer dizer “escolher, eleger”. Os rabinos judeus da LXX traduziram com o mesmo verbo grego ἐκλέγω do NT. E assim, vários outros textos que fazem o uso das mesmas palavras e demonstram que Deus escolheu o seu povo e não todas as pessoas.

Isso confirma o que Deus já tinha falado a seu servo Abraão:

Genesis 18:17-19  17 Disse o SENHOR: Ocultarei a Abraão o que estou para fazer,  18 visto que Abraão certamente virá a ser uma grande e poderosa nação, e nele serão benditas todas as nações da terra?  19 Porque eu o escolhi para que ordene a seus filhos e a sua casa depois dele, a fim de que guardem o caminho do SENHOR e pratiquem a justiça e o juízo; para que o SENHOR faça vir sobre Abraão o que tem falado a seu respeito.

Nesse texto, Deus demonstra que a escolha é individual para chegar a uma nação. Deus escolheu Abraão, e dele viria uma grande nação. Isso vai contra a ideia que a eleição é apenas a nação e não o indivíduo como vou abordar isso mais na frente.

No NT, são contundentes mais ainda os textos:

Matthew 22:14  14 Porque muitos são chamados, mas poucos, escolhidos.

Essa expressão se repete de Mt 20.16. A palavra grega εκλεκτοι usada para “escolhidos” vem do mesmo verbo grego ἐκλέγω. Portanto, Jesus afirma claramente que poucos são escolhidos. Jamais a escolha inclui todas as pessoas.

No entanto, uma das falácias dos arminianos é dizer, quando não têm respostas, que o texto não se refere à salvação. No entanto, o contexto é de paráboras demonstrando a escolha soberana de Deus em escolher um povo que não fosse judeu, portanto, relacionando-se à salvação dos gentios também.

John 15:16  16 Não fostes vós que me escolhestes a mim; pelo contrário, eu vos escolhi a vós outros e vos designei para que vades e deis fruto, e o vosso fruto permaneça; a fim de que tudo quanto pedirdes ao Pai em meu nome, ele vo-lo conceda.

ουχ υμεις με εξελεξασθε αλλ εγω εξελεξαμην υμας και εθηκα υμας ινα υμεις υπαγητε και καρπον φερητε και ο καρπος υμων μενη ινα ο τι αν αιτησητε τον πατερα εν τω ονοματι μου δω υμιν

Esse texto é bem forte em demonstrar que a eleição e escolha de Deus não são para todos. Jesus afirma que não foram eles que o escolheram. Isso quer dizer que não houve nenhuma ação vindo do “livre arbítrio” vindo dos discípulos para com Jesus. Ele os escolheu.

Para a falácia dos incautos em afirmar que não se trata de salvação, mas essa escolha se refere somente aos discípulos em específico, devemos lembrar que se tirarmos esse verso somente para os discípulos, tiraremos os demais. Portanto, o ensinamento de Jesus em dar fruto e estar na Videira cai por terra para a Igreja também. No entanto, os apóstolos quando escreveram os Evangelhos tinham a intenção de falar à Igreja e eles sabiam que se referia ao povo de Deus. Em todo caso, de alguma forma, Cristo que os escolheu e não o contrário.

Para falar ainda do que o Dr. Craig interpretou de Romanos 9, vamos tentar responder algumas más interpretações dos arminianos quando lidam com esse texto porque, em suma, eles seguem pelo mesmo caminho.

O Dr. Craig começou a expor que Paulo tinha a intenção de mostrar que judeu não era somente os da carne e que a justiça de Deus não vinha das obras da Lei. Ele reconhece que Paulo queria mostrar aos judeus que Deus escolheu também os gentios, que eram considerados “cães” pelos judeus.

Com isso, Dr. Craig afirma que o capítulo 9 de Romanos é para explicar que Deus tem misericórdia dos gentios também por que ele escolhe quem ele quer. Ele escreveu:

“A resposta de Paulo é que Deus é soberano. Ele pode salvar quem ele quiser, e ninguém pode objetá-lo. Ele tem liberdade para ter misericórdia de quem quer, até mesmo dos execráveis gentios, e ninguém pode reclamar de que Deus está sendo injusto.”

O Dr. Craig começou bem. O problema é que ele esqueceu ou não levou em conta que os exemplos que Paulo deu em Romanos 9.1-24 foram somente de indivíduos judeus e não gentios. Isso significa que Paulo queria mostrar que os judeus, apesar de terem o privilégio de serem responsáveis pelos oráculos de Deus (Rm 3.2) e de descenderem o Cristo (Rm 9.4), precisavam também de um ato soberano de Deus para responder com fé, e não somente os gentios.

Paulo jamais queria ensinar nesse texto que a escolha soberana de Deus era somente os gentios, pois ele começou com os judeus (Rm 9.1-23) para depois falar dos gentios (Rm 9.24-26).

Para aqueles que afirmam que Romanos 9 é somente para os judeus ou para a nação de Israel comentem erro gravíssimo de Hermenêutica, pois Paulo tem exposto nesta epístola desde do primeiro capítulo que a igreja (de Roma) era composta de judeus e gentios, e que ambos precisavam de fé para a salvação.

Romans 1:7  A todos os amados de Deus, que estais em Roma, chamados para serdes santos, graça a vós outros e paz, da parte de Deus, nosso Pai, e do Senhor Jesus Cristo.

Depois, Paulo, várias vezes, ensinou que a Salvação de Deus, desde o VT, incluía a fé e não somente um critério étnico. (veja meu texto na Fides Reformata sobre a interpretação de Rm11.26)

Paulo, então, argumenta e deixa bem claro que o propósito de Deus era a sua igreja composta do seu povo do VT e que se uniu aos gentios pela promessa:

Romans 9:6-8  6 E não pensemos que a palavra de Deus haja falhado, porque nem todos os de Israel são, de fato, israelitas;  7 nem por serem descendentes de Abraão são todos seus filhos; mas: Em Isaque será chamada a tua descendência.  8 Isto é, estes filhos de Deus não são propriamente os da carne, mas devem ser considerados como descendência os filhos da promessa.

Paulo mostra que a igreja é composta dos “Filhos de Deus”, que são os filhos da Promessa que são compostos de judeus e gentios. Notemos que Paulo escreve que os filhos de Deus não são propriamente os da carne. Ele se refere aos judeus que tinham apenas a geração étnica. No entanto, quando ele fala sobre os filhos da promessa, ele se refere tanto a judeus como também a gentios.

Romans 3:30  30 visto que Deus é um só, o qual justificará, por fé, o circunciso e, mediante a fé, o incircunciso.

Por isso que Paulo ensinou que a igreja herdou a bênção de Abraão, e não somente os judeus:

Galatians 3:13-14  13 Cristo nos resgatou da maldição da lei, fazendo-se ele próprio maldição em nosso lugar (porque está escrito: Maldito todo aquele que for pendurado em madeiro),  14 para que a bênção de Abraão chegasse aos gentios, em Jesus Cristo, a fim de que recebêssemos, pela fé, o Espírito prometido.

O outro engano do Dr. Craig é quando ele faz a seguinte afirmação: “Ele tem liberdade para ter misericórdia de quem quer, até mesmo dos execráveis gentios, e ninguém pode reclamar de que Deus está sendo injusto”.

O Dr. Craig dá a entender que se Deus não escolher alguns, a justiça de Deus fica em evidência como se as pessoas merecessem a salvação podendo “reclamar” de Deus. Mais uma vez, como sempre, o Dr. Craig tropeça porque não levou em conta que ninguém merece a salvação. Foi exatamente isso que Paulo quis demonstrar na epístola aos Romanos que a salvação é SOMENTE PELA FÉ:

Romans 3:10-19  10 como está escrito: Não há justo, nem um sequer,  11 não há quem entenda, não há quem busque a Deus;  12 todos se extraviaram, à uma se fizeram inúteis; não há quem faça o bem, não há nem um sequer.  13 A garganta deles é sepulcro aberto; com a língua, urdem engano, veneno de víbora está nos seus lábios,  14 a boca, eles a têm cheia de maldição e de amargura;  15 são os seus pés velozes para derramar sangue,  16 nos seus caminhos, há destruição e miséria;  17 desconheceram o caminho da paz.  18 Não há temor de Deus diante de seus olhos.  19 Ora, sabemos que tudo o que a lei diz, aos que vivem na lei o diz para que se cale toda boca, e todo o mundo seja culpável perante Deus,

Portanto, ninguém tem o direito de reclamar de Deus caso ele não o escolha porque não há nenhum justo que reivindique esse direito de salvação. Esse foi o argumento de Santo Agostinho ao citar o texto de Mt 11.20-22, pois o texto nos deixa claro que Deus não quis salvar Tiro, Sidom, Sodoma e Gomorra, pois se os milagres que Jesus fez ocorressem nessas cidades, eles teriam sido salvos.

Matthew 11:20-22  20 Passou, então, Jesus a increpar as cidades nas quais ele operara numerosos milagres, pelo fato de não se terem arrependido:  21 Ai de ti, Corazim! Ai de ti, Betsaida! Porque, se em Tiro e em Sidom se tivessem operado os milagres que em vós se fizeram, há muito que elas se teriam arrependido com pano de saco e cinza.  22 E, contudo, vos digo: no Dia do Juízo, haverá menos rigor para Tiro e Sidom do que para vós outras.

Se Deus quer salvar a todos, por que ele não fez os milagres nessas cidades para que eles se arrependessem? Deus deixou de ser justo por não salvar os habitantes de Sodoma e Gomorra ou de Tiro e Sidom? Mesmo que pensemos antes da fundação do mundo, Deus é o soberano e quem somos nós para questionar o seu plano? Deus escolheu agir de uma forma que ele escolhesse aqueles a quem ele quer (Ef 1.5)?

É isso que Paulo tenta mostrar nesse capítulo:

Romans 9:20-24   20 Quem és tu, ó homem, para discutires com Deus?! Porventura, pode o objeto perguntar a quem o fez: Por que me fizeste assim?  21 Ou não tem o oleiro direito sobre a massa, para do mesmo barro fazer um vaso para honra e outro, para desonra?  22 Que diremos, pois, se Deus, querendo mostrar a sua ira e dar a conhecer o seu poder, suportou com muita longanimidade os vasos de ira, preparados para a perdição,  23 a fim de que também desse a conhecer as riquezas da sua glória em vasos de misericórdia, que para glória preparou de antemão,  24 os quais somos nós, a quem também chamou, não só dentre os judeus, mas também dentre os gentios?

O Dr. Craig chega a uma conclusão que é de todo arminiano: a escolha de Deus dependerá dos que creem. Ou seja, Deus escolhe apenas aqueles que ele sabe que iriam crer. Ele escreve:

“Então – e este é o ponto crucial – quem é que Deus escolheu salvar? A resposta é: aqueles que têm fé em Cristo”

O Dr. Craig não levou em conta vários fatores lógicos e escriturísticos. Se Deus escolhe salvar dependendo da fé que ele previu, isso não é escolha soberana segundo o pleno prazer da sua vontade (κατα την ευδοκιαν του θεληματος αυτου) conforme Paulo escreveu aos efésios (Ef 1.5). Nesse caso, não é uma eleição soberana, mas um acerto de contas porque a promessa é que aquele que cresse seria salvo (Hc 2.4; Jo 3.36)

Imaginemos que um dono de uma empresa de chocolates fizesse uma promoção de doar uma casa a todos aqueles que guardassem a capa do bombom de chocolate. Ele percebe que em uma cidade de 180.000 habitantes, 50.000 guardaram essa capa do bombom de chocolate. Depois, ele chega e afirma: “eu escolhi dar por livre espontânea vontade a esses 50.000 habitantes uma casa”. Todos iriam entender que ele estava querendo se aproveitar da situação, porque o que ele tinha de fazer era apenas cumprir o que foi prometido e por méritos daquelas pessoas que guardaram o papel do bombom.

Assim seria a eleição de Deus. Se ela dependesse da fé, Deus não escolheria livremente segundo o “beneplácido da sua vontade ou o bem-querer da sua vontade (Ef 1.5), mas o critério seria a fé como primordial para a salvação antes mesmo da sua escolha, sendo um merecimento.

Foi essa a conclusão que Paulo chegou quando falou da fé de Abraão:

Romans 4:2-4  2 Porque, se Abraão foi justificado por obras, tem de que se gloriar, porém não diante de Deus.  3 Pois que diz a Escritura? Abraão creu em Deus, e isso lhe foi imputado para justiça.  4 Ora, ao que trabalha, o salário não é considerado como favor, e sim como dívida.

Paulo demonstra que, se Abraão fosse justificado por obras, ele poderia se gloriar porque seria como se fosse um salário. Notemos que Paulo além de demonstrar que a fé de Abraão estava relacionada a obras, esta não vinha dele mesmo, pois a fé sempre deve vir acompanhada de obras para que esteja viva, pois sem obras a fé está morta:

Tiago 2:20-22   20 Queres, pois, ficar certo, ó homem insensato, de que a fé sem as obras é inoperante?  21 Não foi por obras que Abraão, o nosso pai, foi justificado, quando ofereceu sobre o altar o próprio filho, Isaque?  22 Vês como a fé operava juntamente com as suas obras; com efeito, foi pelas obras que a fé se consumou,

Portanto, Tiago completa o raciocínio de Paulo quando afirma que a fé de Abraão incluía obras também, só que obras como resultado da fé. E se essa fé viesse do próprio Abraão, seria apenas como se fosse um salário e nada mais.

Depois, em muitas passagens, a Bíblia nos ensina que a fé não procede de nós ou que não está em nós mesmos:

Ephesians 2:8   8 Porque pela graça sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós; é dom de Deus;

τη γαρ χαριτι εστε σεσωσμενοι δια της πιστεως και τουτο ουκ εξ υμων θεου το δωρον

Notemos que τουτο é neutro demonstrando que Paulo se refere tanto à graça (que é óbvio, se não, não seria graça), como também à fé – τουτο ουκ εξ υμων

O outro texto está:

Romans 12:3   3 Porque, pela graça que me foi dada, digo a cada um dentre vós que não pense de si mesmo além do que convém; antes, pense com moderação, segundo a medida da fé que Deus repartiu a cada um.

Notemos que a fé é repartida por Deus a cada um.

O outro texto demonstra que Cristo é o autor da fé:

Hebrews 12:2  2 olhando firmemente para o Autor e Consumador da fé, Jesus, o qual, em troca da alegria que lhe estava proposta, suportou a cruz, não fazendo caso da ignomínia, e está assentado à destra do trono de Deus.

O substantivo αρχηγον tem como significado de autor contrastando com a palavra consumador τελειωτην.

Depois, o Dr. Craig erra gravemente quando não leva em conta o contexto do próprio capítulo 9 do livro de Romanos. Vejamos:

Paulo defende que os filhos de Abraão não são os propriamente da carne, mas aqueles que descendem das promessas (v.8). Depois, ele usa o exemplo de Sara e Rebeca para falar da salvação soberana da Igreja (gentios e judeus) (v.9).

Paulo, então, dá o exemplo do nascimento de Jacó e Esaú, pois deles descenderia a descendência da promessa. Paulo começa a mostrar a total soberania em escolher Jacó e não Esaú dizendo que:

Romans 9:11   11 E ainda não eram os gêmeos nascidos, nem tinham praticado o bem ou o mal (para que o propósito de Deus, quanto à eleição, prevalecesse, não por obras, mas por aquele que chama),

Quando Paulo fala que os meninos ainda não tinham nascidos nem praticado o bem ou mal, Paulo estava falando da fé, pois o mal de uma pessoa inclui a incredulidade. Por isso, ele afirma que Esaú não tinha praticado o bem ou o mal para que o propósito de Deus com respeito à eleição prevalecesse.

Isso significa que Deus os elegeu levando em conta a antecipação do nascimento e não, como afirmam os arminianos, que ele previu que iam crer ou não. O texto é bem claro em afirmar que a eleição das crianças veio antes dos seus nascimentos, não levando em conta nem o bem e nem o mal que eles fariam. Portanto, pelo texto, Deus levou em conta as crianças antes de nascer e não o que ele previu quando crescessem e desenvolvessem fé.

Paulo continua seu raciocínio afirmando que:

Romans 9:13  13 Como está escrito: Amei Jacó, porém me aborreci de Esaú.
καθως γεγραπται τον ιακωβ ηγαπησα τον δε ησαυ εμισησα

Alguns tentam amenizar esse texto afirmando que o verbo traduzido para “aborreci”, que não deixa de ser amenizado, é “amar menos”. Podemos até entender aqueles que traduzem assim, pois a maioria dos arminianos não conhece o original e passam a dar interpretações próprias. No entanto, é a tradução mais desonesta e absurda que alguém possa conhecer da Bíblia.

Tanto o verbo hebraico sane’, como o verbo grego μισεω na LXX de Ml 1.3, como também no NT,  pois é o mesmo verbo grego que Paulo usou na epístola, querem dizer mesmo “odiar”, “irar-se contra”.

Portanto, Deus desprezou, irou-se contra Esaú e escolheu a Jacó. Daí vem todas aquelas perguntas e declarações arminianas que não creem nesse tipo de amor de Deus dos calvinistas e que não aceitam que Deus fizesse isso, pois seria injusto.

No entanto, por causa desses questionamentos que Paulo escreve os versos 14 a 23

Romans 9:14-16  14 Que diremos, pois? Há injustiça da parte de Deus? De modo nenhum!  15 Pois ele diz a Moisés: Terei misericórdia de quem me aprouver ter misericórdia e compadecer-me-ei de quem me aprouver ter compaixão.  16 Assim, pois, não depende de quem quer ou de quem corre, mas de usar Deus a sua misericórdia.

Paulo deixa claro que Deus tem misericórdia e compaixão de quem ele decidir ter misericórdia (assim está no original). Ele termina jogando por terra o livre arbítrio, pois Paulo afirma que não depende de quem quer, mas de Deus. Isso tem que acontecer porque o nosso arbítrio está corrompido pelo pecado e jamais escolheríamos a Deus se ele não intervir.

Além do mais, esse texto também vai contra a ideia de alguns que afirmam que Romanos 9 é para a nação de Israel e não para indivíduos. Paulo dá o exemplo de Abraão, Esaú, Jacó, e Faraó, como exemplos que estava tratando de indivíduos. Na verdade, em todo o contexto da epístola aos Romanos, Paulo tratou sempre de indivíduos porque a salvação é individual.

Depois, essa ideia de eleição de nação e não de indivíduo não é inteligente porque uma nação é composta de indivíduos e a salvação é individual. Se uma nação é composta de indivíduos e a salvação é individual, é óbvio e coerente que Paulo estava falando de indivíduos que constituiriam a igreja que é composta de judeus e gentios.

Quanto a João 6.65, Dr. Craig não falou muito, pois não tinha muito que falar diante da clareza do texto. No contexto, Jesus falou esse texto porque alguns não criam e ele conhecia essas pessoas, inclusive quem iria traí-lo. Por causa disso, ele afirma que ninguém pode vir a ele se não for concedido pelo Pai. O verbo grego διδωμι / δεδομενον está no perfeito passivo que demonstra que o sujeito sofre a ação, ou seja, uma pessoa somente vai a Jesus se sofrer a ação de ser concedida pelo Pai.

Jesus já tinha falado nos versos anteriores:

John 6:44   44 Ninguém pode vir a mim se o Pai, que me enviou, não o trouxer; e eu o ressuscitarei no último dia.

O verbo grego ἑλκω traduzido para “trazer” é mais forte no original. Significa “arrancar, puxar”. Jesus está afirmando que ninguém pode vir a ele se o Pai não o arrancar, puxar, demonstrando a total soberania de Deus na salvação e a nossa resistência de ir a Deus por conta própria. Portanto, o texto é bem claro acerca da soberania de Deus na salvação.

A resposta à acusação que Deus é um tirano:

Tirano é alguém que usurpa o poder; que adquire o poder de uma forma injusta. Deus, não. Deus é o supremo Senhor e Soberano legítimo, e mais ainda digno de adoração por ser esse Senhor soberano e Deus.

Quando afirmamos que a eleição de Deus o torna indigno de adoração, estamos tentando afirmar que temos mais justiça que ele ou mais sabedoria que ele. Quanto a isso, os profetas respondem que não passamos de cacos de barro ou vasos nas mãos do oleiro (Is 45.9; Rm 9.20-21).

Mesmo assim, nada disso vai contra a sua existência, mesmo que ele fosse realmente um tirano ou qualquer que seja seu caráter. Quanto mais que Deus é o único Deus e Senhor Soberano Legítimo do Universo.







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