terça-feira, 13 de dezembro de 2022

UMA ANÁLISE DO TEXTO DO FILÓSOFO LUIZ FELIPE PONDÉ NA FOLHA DE SÃO PAULO “POR QUE EXISTE O MAL? ESTA REFLEXÃO É UM XEQUE-MATE NO CRISTIANISMO”


 

            O texto do filósofo Luiz Felipe Pondé “Por que existe o mal? Esta reflexão é um xeque-mate no Cristianismo” da Folha de São Paulo de 12 de dezembro é, no mínimo, muito pretencioso e arrogante. Afirmar que esse assunto encerra ao ponto de dizer com a metáfora “xeque-mate no Cristianismo” é entrar no círculo até da ingenuidade.

            Primeiro, porque o Cristianismo não existe por causa de uma ideologia, mas por causa do Cristo que traz o seu nome e que ressuscitou conforme os escritos dos apóstolos e historiadores da época, e vive para sempre. Segundo, Pondé esquece que há milhares de filósofos, teólogos, cientistas, matemáticos, físicos cristãos em grandes universidades do mundo que abonam o Cristianismo e creem nas palavras de Cristo como essenciais à vida.

         A tentativa de Pondé em evidenciar o Cristianismo com base no mal não é nova. Agostinho de Hipona, no ano 386, na sua obra De Ordine Confissões, já refutava essa tentativa de desqualificar o Cristianismo por causa do “problema do mal” com base no famoso paradoxo Trilema de Epicuro que se resume: “Se Deus é onisciente e onipotente, então, ele tem conhecimento de todo o mal e pode acabar com o mal, e se ele não o faz, ele não pode ser bom. Se Deus é onipotente e bom, então, ele tem poder para acabar com o mal e deseja acabar com o mal, porque é bom, e se não o faz, ele não é onisciente. Por último, se Deus é onisciente e bom, então, ele sabe de todo o mal que existe e quer acabar com ele, e se ele não o faz, ele não é onipotente”.

          Na verdade, o paradoxo de Epicuro que muitos ateus até usam para questionar a existência de Deus não vai contra a sua existência em si, mas contra a sua bondade. Negar a existência de Deus por questionar a sua bondade seria como negar a existência de Shakespeare por achar que ele foi péssimo escritor. Depois, o paradoxo de Epicuro se desmancha ao conhecermos mais sobre os atributos de Deus, incluindo sua providência. Deus é onisciente, onipotente e totalmente bom, porém, precisamos saber o que significa “o bom”. Se Deus é a realidade última, o Criador de todas as coisas, o que dá sentido a todo conhecimento, o legislador final, então “o bom” só pode ser relacionado a ele mesmo. “O bom” para Deus é exatamente a sua glória e isso chegou ao ápice dessa glória quando Jesus Cristo morreu na cruz como promessa do Velho Testamento de propiciação pelos pecados da humanidade. Por isso, Jesus falou em João 13.31-32: “Agora, foi glorificado o Filho do Homem, e Deus foi glorificado nele; se Deus foi glorificado nele, também Deus o glorificará nele mesmo; e glorificá-lo-á imediatamente”. Logo, Deus foi glorificado no mal mais cruel que pudesse existir no mundo, a morte de seu Filho Unigênito totalmente santo e inocente. Por isso que não acho inteligente defender o mal existente afirmando que “não existe o mal, mas ausência do bem”. Isso é falacioso e não é inteligente. Com esse argumento, eu negaria qualquer coisa. Por exemplo: aquele que afirma que "não existem trevas, mas ausência de luz", poderia dizer também que não existe luz, mas ausência de trevas. Também, poderia dizer: não existe a matéria, mas a ausência do nada; não existe a mentira, mas a ausência da verdade. Jesus mesmo chegou a ensinar sobre a distinção clara entre o bem e o mal (Lucas 6.9). Portanto, esse argumento não é inteligente e não explica esse problema.

            Diante disso, se Deus é a realidade última e supremo Criador, ele pode tirar vida ou permitir o mal terreno moral ou natural para chegar ao supremo “bem”, a sua glória. Portanto, Deus é onipotente para extinguir todo mal existencial, mas ele não quer no momento. Além disso, a onipotência, onisciência e a bondade de Deus precisam ser vistas em amenizar o mal moral no mundo e em sustentar toda a existência física. Se Deus não amenizasse o mal moral na humanidade e sustentasse todas as coisas, todos destruiriam uns aos outros ou seriam exterminados, pois ele é o que dá respiração e sustenta todos átomos e células do universo (Atos 17.25). Todos os dias, sol e chuva estão à disposição de todos como Jesus falou: “para que vos torneis filhos do vosso Pai celeste, porque ele faz nascer o seu sol sobre maus e bons e vir chuvas sobre justos e injustos”. Portanto, a onipotência, onisciência e a bondade de Deus, mesmo sem demonstrar a sua plenitude, no momento, não deixam de revelar-se no mundo.

            Dito isso, precisamos analisar algumas expressões do filósofo Pondé: 

Primeiro, ele se baseia na citação de Albert Camus: “a pura e simples indiferença do universo e da natureza para com o nosso sofrimento já é vivida como um mal para nós”. Essa declaração não leva em conta a existência do Deus único e bondoso que não está indiferente, mas cada episódio e mal natural que ele permite é um convite para a humanidade olhar para cima, para ele. Seria como um grito de Deus à humanidade para que se arrependam e saibam que há algo maior que essa vida e maior que tudo que nós mesmos conceituamos como bom. Jesus ensinou isso em Lucas 13.1-5.

            Pondé também afirma que “o Cristianismo criou um problema mais grave do que as demais religiões para responder à questão por que o mal existe?”. Ele conclui que isso se deve porque “o Cristianismo inventou que Deus é amor, que Deus é bom e todo-poderoso, e aí ferrou tudo” e que foi obrigado a criar um outro princípio que foi chamado de “Satanás”. Notemos que cai no mesmo paradoxo trilema de Epicuro que escrevi acima e que não preciso falar mais. No entanto, precisa-se dizer que não foi o Cristianismo que “inventou” que Deus é amor. Jesus Cristo se expôs em público aos olhos de todos na época e isso foi exposto pelos evangelistas como o grande amor de Deus revelado na sua morte como expiação pelos pecados daqueles que cressem em seu nome. Por isso, o evangelista João escreveu: “Porque Deus amou ao mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (João 3.16). Da mesma forma, os seus outros atributos são demonstrados, tanto em suas obras registradas nas páginas dos relatos da Bíblia, quanto na própria natureza em que há Design Inteligente manifestado em informação de altíssimo nível, antevidência e complexidade irredutível. 

            Ele ainda cita Dostoievski: “não há resposta que perdoe a Deus pelo sofrimento de uma criança inocente. Se ele existe, ele é cruel ou fraco”. Para responder a isso precisa-se pensar o conceito de inocência e sobre a natureza de Deus como a causa única e Criador. Se o conceito de inocência for a ausência de atos pecaminosos momentâneos contra o próprio Deus, poderemos até entender esse conceito, mas se pensarmos que em uma criança está toda a sua mais cruel natureza pronta para transgredir todas as leias do próprio Deus e dos homens, não há inocente na terra. Devemos lembrar que Herodes, Nero, Hitler e todos os tiranos sanguinários foram criancinhas lindinhas “inocentes”. Portanto, Deus não tem ninguém por inocente, exceto aqueles a quem ele mesmo justifica em Jesus Cristo. Depois, se Deus é a causa última, Criador e Juiz único do universo, toda morte é porque ele quer, seja do mais simples pardal que cai (Mateus 10.29), seja de qualquer ser humano (Jeremias 13.16). Por isso, Deus não é cruel nem fraco, mas cumpre seu plano diante da sua grandeza fazendo tudo para a sua glória. Da mesma forma, o personagem Satanás não veio de um mito, nem veio da boca de um poeta romântico, porém, veio da boca de Jesus Cristo; e, se Jesus é o que reivindica ser, Satanás não é uma invenção nem um mito, mas uma realidade. 

            Enfim, ele conclui que “o argumento a partir do mal é um xeque-mate no Cristianismo”. Na verdade, usando a metáfora acima, o Rei ainda está exposto e não é o do Cristianismo. Há saída, com folga, para o xeque. Jamais seria um xeque-mate; porém, há uma declaração de xeque-mate exposta agora e que o convido a sair dela. Jesus Cristo veio e fundamentou o Cristianismo como uma construção cuja Pedra Fundamental é ele mesmo com uma promessa de que as portas do Inferno não prevalecerão contra a sua igreja. Se a sua igreja é cristã e está dentro da identidade do Cristianismo, nada a destruirá. No entanto, os homens citados pelo filósofo já passaram, morreram; suas ideias são questionadas e suplantadas. As palavras de Cristo e o próprio Cristo, não, são eternas, Cristo está vivo, o Cristianismo está vivo.