quinta-feira, 16 de novembro de 2023

PROFETAS DO NOVO TESTAMENTO




RESUMO

O artigo tem a finalidade de demonstrar que o dom de profeta do NT se manifesta de dois tipos: um diz respeito a uma classe de apóstolos que não estavam dentro do círculo dos doze que andavam com Jesus, mas tinham a mesma autoridade apostólica. Esses profetas eram também testemunhas de Cristo, por isso, tinham autoridade de escrever Palavra de Deus e, como os apóstolos, não existem mais. O outro era alguém que recebia um dom do Espírito Santo para edificar a igreja de Cristo. Nesse artigo demonstro, com base nas Escrituras, que o dom de profecia distribuído pelo Espírito Santo pode ser preditivo e não corresponde à pregação do Evangelho como afirmam alguns eruditos cessacionistas. Demonstro, também, que os profetas carismáticos precisam ser julgados e avaliados se estão falando segundo as Escrituras e que jamais a profecia deve tomar o lugar da pregação das Escrituras. Os textos usados como base foram toda a Escritura, especificamente, os textos do NT em Português da Bíblia Revista Atualizada e em grego do Majority Greek Text. 

 

Introdução

 

Uma das tarefas mais difíceis é demonstrar a verdade quando ela vem misturada com o engano. Na verdade, essa é a grande estratégia do diabo: tentar desqualificar a verdade misturando-a com a mentira. A parábola do Joio e do trigo, falada por Jesus, demonstra essa grande verdade. O conselho do dono da lavoura, em que ele pede para ter cuidado com a retirada do joio para não prejudicar o trigo, demonstra que se precisa ter atenção de não entrar exatamente no plano do diabo nisso.

        O fato de ter falsos profetas na atualidade, igrejas neopentecostais que exploram e trocam o ensino das Escrituras por palavras de profetas duvidosos e pervertidos, ou a existência dos chamados “profetas do Pix” não pode invalidar a verdade das Escrituras. Ao contrário, a verdade das Escrituras deve ser evidenciada pelo seu ensino correto a fim de que a igreja possa perceber os enganos do que é falso. Da mesma forma, não se pode jogar fora as cédulas verdadeiras de dinheiro por haver várias cédulas falsas na região, porém, deve-se perceber com maior dedicação como as verdadeiras são para identificar as falsas ou os falsários.

            Meu intuito é exatamente esse: trazer maior percepção desse dom do Espírito tão desgastado e tão mal interpretado, unindo-me a muitos que tentaram fazer isso, reconhecendo que a queda nos fez limitados na interpretação da Bíblia, ou até na percepção de textos que não levamos em conta por causa da nossa cosmovisão. Por isso, eu trago esse artigo para unir-se a alguns livros e textos que falam sobre os profetas do NT. 

            O Novo Testamento (NT) traz dois tipos de profetas:

 

1. O Profeta relacionado aos apóstolos que não estavam contados entre os doze

 

           A primeira designação de profeta era outro nome para apóstolos que não faziam parte da escola dos doze apóstolos de Jesus, mas que eram considerados apóstolos e tinham autoridade apostólica de escrever Palavra de Deus. Por exemplo, temos: Paulo, Barnabé, Marcos, Lucas, Tiago, Judas. Todos esses não faziam parte dos doze apóstolos e eram considerados “profetas”, “outra classe de apóstolos”. Geralmente essa designação vem sempre junta com a palavra “apóstolos” e suas palavras não podiam ser questionadas. Por isso, Paulo escreveu:

 

Efésios 2:20 (ARA) 20 edificados sobre o fundamento dos apóstolos e profetas, sendo ele mesmo, Cristo Jesus, a pedra angular;

 

Efésios 3:5 (ARA) 5 o qual, em outras gerações, não foi dado a conhecer aos filhos dos homens, como, agora, foi revelado aos seus santos apóstolos e profetas, no Espírito,

 

Efésios 4:11 (ARA) 11 E ele mesmo concedeu uns para apóstolos, outros para profetas, outros para evangelistas e outros para pastores e mestres,

 

Notemos que nesse texto, Paulo já trazia o contexto desses profetas nos capítulos anteriores que era de fazerem parte do fundamento da Igreja do NT juntamente com os apóstolos (At 13.1).

 

(ARA) Atos 13.1 1 Havia na igreja de Antioquia profetas e mestres: Barnabé, Simeão, por sobrenome Níger, Lúcio de Cirene, Manaém, colaço de Herodes, o tetrarca, e Saulo.

 

2 Pedro 3:2-3 (ARA) 2 para que vos recordeis das palavras que, anteriormente, foram ditas pelos santos profetas, bem como do mandamento do Senhor e Salvador, ensinado pelos vossos apóstolos, 3 tendo em conta, antes de tudo, que, nos últimos dias, virão escarnecedores com os seus escárnios, andando segundo as próprias paixões

 

 O apóstolo Pedro reconhece que esses profetas tinham autoridade semelhante aos apóstolos e dos mandamentos do Senhor Jesus Cristo. No entanto, pode haver uma dúvida se Pedro não estaria escrevendo sobre os profetas do VT. Notemos que Pedro pede que eles se recordem das “palavras que, anteriormente, foram ditas” / μνησθῆναι τῶν προειρημένων ῥημάτων ὑπὸ τῶν ἁγίων προφητῶν, o verbo grego προειρημένων no particípio perfeito passivo de προερέω significa “dizer, expressar-se anteriormente” (Gl 1.9). Portanto, Pedro faz referência de que deveriam lembrar do que esses profetas disseram e não do que eles escreveram, fazendo, com isso, referência aos profetas do NT que ele coloca no mesmo nível dos mandamentos do Senhor Jesus.

 

Além disso, Pedro faz uma possível referência ao ensino de Paulo a Timóteo que afirma:

 

2 Timóteo 3:1-5 (ARA) 1 Sabe, porém, isto: nos últimos dias, sobrevirão tempos difíceis, 2 pois os homens serão egoístas, avarentos, jactanciosos, arrogantes, blasfemadores, desobedientes aos pais, ingratos, irreverentes, 3 desafeiçoados, implacáveis, caluniadores, sem domínio de si, cruéis, inimigos do bem, 4 traidores, atrevidos, enfatuados, mais amigos dos prazeres que amigos de Deus, 5 tendo forma de piedade, negando-lhe, entretanto, o poder. Foge também destes.

 

            Judas confirma esse texto de Pedro chamando esses profetas de “apóstolos”, assim como o próprio Paulo se denominava:

 

Judas 1:17-18 (ARA) 17 Vós, porém, amados, lembrai-vos das palavras anteriormente proferidas pelos apóstolos de nosso Senhor Jesus Cristo, 18 os quais vos diziam: No último tempo, haverá escarnecedores, andando segundo as suas ímpias paixões.

 

            Esses “profetas” foram chamados por Paulo de “outro dos apóstolos”:

 

Gálatas 1:18-19 (ARA) 18 Decorridos três anos, então, subi a Jerusalém para avistar-me com Cefas e permaneci com ele quinze dias; 19 e não vi outro dos apóstolos, senão Tiago, o irmão do Senhor.

 

Gálatas 1:18-19 18 Ἔπειτα μετὰ ἔτη τρία ἀνῆλθον εἰς Ἱεροσόλυμα ἱστορῆσαι Πέτρον, καὶ ἐπέμεινα πρὸς αὐτὸν ἡμέρας δεκαπέντε. 19 Ἕτερον δὲ τῶν ἀποστόλων οὐκ εἶδον, εἰ μὴ Ἰάκωβον τὸν ἀδελφὸν τοῦ κυρίου.

 

            Paulo, nesse texto, faz uma diferença entre Pedro (Byz) / Cefas (NA28) e Tiago, irmão do Senhor, que tinha o reconhecimento de autoridade apostólica entre os doze apóstolos (At 15.13; 22). Paulo o coloca no grupo do que ele chamou de Ἕτερον τῶν ἀποστόλων. O adjetivo ἕτερος, que significa “outro de outra classe” evidenciando a diferença entre ἄλλος que significa “outro da mesma classe” sem evidenciar diferença, passa a ser um substantivo por ser o núcleo do objeto direto do verbo εἶδον. Já o substantivo ἀπόστολος na locução τῶν ἀποστόλων tem a função de adjunto adnominal qualificando o núcleo do objeto direto substantivado Ἕτερον. Assim, não se pode analisar esse genitivo como um adjunto adverbial como se entendesse o ἕτερος vindo dos apóstolos, pois, se a expressão τῶν ἀποστόλων fosse um adjunto adverbial, teria que modificar um adjetivo, advérbio ou verbo, porém, a expressão está interligada a Ἕτερον que é acusativo, núcleo do objeto direto do verbo εἶδον, dando-lhe, obrigatoriamente, a função do genitivo de adjunto adnominal e qualificador por modificar um substantivo (adjetivo substantivado – núcleo do objeto direto). Para ilustrar melhor que τῶν ἀποστόλων é qualitativo, poderíamos mudar a frase para “Não vi outra classe apostólica, senão, Tiago, o irmão do Senhor”. Portanto, Paulo queria falar que Tiago era uma outra classe dos apóstolos. Assim, a tradução mais razoável para que não haja ambiguidade do verso 19 Ἕτερον δὲ τῶν ἀποστόλων οὐκ εἶδον, εἰ μὴ Ἰάκωβον τὸν ἀδελφὸν τοῦ κυρίου deveria ser: “não vi outra classe de apóstolo, senão, Tiago, o irmão do Senhor”.

          Para demonstrar melhor isso, vejamos um texto com semelhança textual grega em Mt 8.21-22;

 

Mateus 8:21-22 (ARA) 21 E outro dos discípulos lhe disse: Senhor, permite-me ir primeiro sepultar meu pai. 22 Replicou-lhe, porém, Jesus: Segue-me, e deixa aos mortos o sepultar os seus próprios mortos.

 

Mateus 8:21-22 21 Ἕτερος δὲ τῶν μαθητῶν αὐτοῦ εἶπεν αὐτῷ, Κύριε, ἐπίτρεψόν μοι πρῶτον ἀπελθεῖν καὶ θάψαι τὸν πατέρα μου. 22 Ὁ δὲ Ἰησοῦς εἶπεν αὐτῷ, Ἀκολούθει μοι, καὶ ἄφες τοὺς νεκροὺς θάψαι τοὺς ἑαυτῶν νεκρούς.

 

            Notemos que Mateus usa expressão semelhante Ἕτερος δὲ τῶν μαθητῶν αὐτοῦ, só que Ἕτερος é nominativo / sujeito e núcleo do sujeito; logo, um adjetivo que pela força sintática tornou-se substantivo. Aqui deixa claro pelo contexto que esse discípulo não fazia parte dos discípulos que seguiam Jesus porque no verso 22 ordena-lhe que o siga Ἀκολούθει μοι. Portanto, fica evidenciado que era uma outra classe de discípulo que não seguia Jesus como os demais. 

Portanto, Paulo qualifica alguns da classe de Pedro dos doze apóstolos e outros da classe de Tiago que não fazia parte dos doze como um dos que ele chamou de “outro dos apóstolos” Ἕτερον τῶν ἀποστόλων.

Esses profetas não podiam ser questionados nem julgados, pois faziam parte do fundamento da fé da Igreja do NT (Ef 2.20). Também, esses profetas, a semelhança dos apóstolos, não haveriam de continuar depois dos apóstolos do NT, pois, somente a eles, foi dada a autoridade de escrever e ensinar a Palavra de Deus. 

 

1 Coríntios 14:36-37 (ARA) 36 Porventura, a palavra de Deus se originou no meio de vós ou veio ela exclusivamente para vós outros? 37 Se alguém se considera profeta ou espiritual, reconheça ser mandamento do Senhor o que vos escrevo.

 

       Nesse texto, Paulo esclarece que a Palavra de Deus ensinada pelos apóstolos era diferente das palavras dos profetas com a designação de profetas dentro dos dons ensinados de 1Co 12; 14. Paulo afirma que a Palavra de Deus veio para eles e não se originou deles. Isso significa que a palavra que recebiam por epístolas dos apóstolos e profetas, incluindo ele mesmo, era diferente. Ele coloca as suas palavras como “mandamentos do Senhor” ὅτι κυρίου εἰσὶν ἐντολαί. A expressão grega tem o qualificativo genitivo antes mesmo do verbo para demonstrar ênfase da procedência dos mandamentos. A expressão ἔντολή κυρίου, ainda, é usada por Jesus e pelos apóstolos para as várias passagens do VT de mandamentos de Deus (Mt 5.19; 15.3). Diante disso, Paulo está trazendo sobre seus escritos, seus ensinos e suas ordenanças uma autoridade do mesmo nível que os mandamentos do VT. Da mesma forma que Pedro considerou os escritos desses apóstolos chamando-os de “profetas” evidenciando o próprio Paulo (2Pe 3.2; 3.15-16).

 

2. Profetas como dom do Espírito Santo de 1Co 12.10

 

Paulo faz uma diferença entre os dois dons de profeta. Ao primeiro estudado, Paulo se refere com a palavra grega δόμα que significa dom no sentido geral:

 

Efésios 4:8 Διὸ λέγει, Ἀναβὰς εἰς ὕψος ᾐχμαλώτευσεν αἰχμαλωσίαν, καὶ ἔδωκεν δόματα τοῖς ἀνθρώποις.

 

    Esse contexto está relacionado ao profeta que vem sempre acompanhado dos apóstolos no v.11 por serem uma classe de apóstolos. Nesse caso, Paulo identifica esses dons de uma forma mais ampla com uma abrangência maior e especial. No caso dos profetas de 1Co 12, Paulo usa uma outra palavra para dom, χάρισμα, vindo da palavra χαρις que significa “graça”, usada no contexto dos dons do Espírito Santo:

 

1 Coríntios 12:4-5 4 Διαιρέσεις δὲ χαρισμάτων εἰσίν, τὸ δὲ αὐτὸ πνεῦμα. 5 Καὶ διαιρέσεις διακονιῶν εἰσίν, καὶ ὁ αὐτὸς κύριος.

 

            Paulo relaciona esses Διαιρέσεις δὲ χαρισμάτων, “diversidade de dons / χαρισμάτων” de διαιρέσεις διακονιῶν, “diversidade de serviços / διακονιῶν”. Essa palavra, que também traduz a palavra ministério e de onde vem a palavra “diácono / diaconia”, demonstra um serviço na igreja e que Paulo ensinou que seria para a edificação dela. Portanto, Paulo já coloca a diferença entre os dois tipos de profeta: um diz respeito à autoridade apostólica, o outro diz respeito a ministério e serviço na igreja do NT. 

 

2.1. As características dos profetas como dom do Espírito Santo de 1Co 12.10

 

            Paulo trata esses profetas diferentemente dos primeiros citados. Esses profetas devem ser julgados:

 

1 Coríntios 14:29 (ARA) 29 Tratando-se de profetas, falem apenas dois ou três, e os outros julguem.

 

1 Coríntios 14:29 Προφῆται δὲ δύο ἢ τρεῖς λαλείτωσαν, καὶ οἱ ἄλλοι διακρινέτωσαν.

 

            Paulo coloca a ordem dos profetas de dois ou três profetizarem e os outros devem julgar. Pelo verbo grego διακρίνω no imperativo, pode-se chegar na inferência de que Paulo ordena julgar o conteúdo dos profetas, ou seja, a profecia, pois o verbo significa, pela preposição δια acrescentada, “julgar fazendo a diferença”. Logo, Paulo coloca esses profetas com um conteúdo preso a uma base absoluta da Palavra de Deus, pois para se julgar e fazer a diferença precisa-se de uma base para isso. Paulo falou isso melhor em Rm 12.6.

 

Romanos 12:6 (ARA) 6 tendo, porém, diferentes dons segundo a graça que nos foi dada: se profecia, seja segundo a proporção da fé;

 

Romanos 12:6 6 Ἔχοντες δὲ χαρίσματα κατὰ τὴν χάριν τὴν δοθεῖσαν ἡμῖν διάφορα, εἴτε προφητείαν, κατὰ τὴν ἀναλογίαν τῆς πίστεως·

 

            Paulo usa a mesma palavra grega para dom, χαρίσματα, que usou em 1Co 12. Portanto, ele está usando a palavra profecia da mesma forma que usou em 1Co 12 e 1Co 14. Assim, ele está falando de profetas dos dons do Espírito de 1Co 12; 14. Para esses profetas, Paulo adverte que eles devem profetizar “segundo a analogia da fé”. A palavra grega ἀναλογίαν é traduzida para “proporção”. Dessa palavra que provém o vocábulo na língua portuguesa “analogia”. De qualquer forma, Paulo a usa para demonstrar conformidade e relação com a fé, a qual é usada, aqui, como uma metonímia que significa o corpo de doutrina que o cristão crê. Portanto, Paulo coloca as profecias de dom do Espírito Santo como sujeitas às doutrinas da fé cristã e que podem perfeitamente ser julgadas e até desprezadas, caso não estejam dentro do escopo doutrinário.

 

2.2. Podemos relacionar as profecias dom do Espírito Santo à pregação da Palavra de Deus?

 

            Muitos eruditos cessacionistas relacionam os profetas e profecias de 1Co 12 e 14 à pregação na igreja. Eles afirmam isso com base em 1Co 14.3 que diz:

 

1 Coríntios 14:3 (ARA) 3 Mas o que profetiza fala aos homens, edificando, exortando e consolando.

 

            Por isso, chegam a uma conclusão que a pregação tem essas mesmas prerrogativas e, por isso, Paulo estaria falando nesse contexto de 1Co 12 e 14 sobre a pregação do Evangelho. Também, partindo desse pressuposto, não aceitam que esse tipo de profeta, sendo usado por Deus, possa falar alguma coisa futura.

            Apesar de que essa interpretação seja mais cômoda diante de tantos hereges e heresias ditas como profecia, fica difícil aceitá-la diante de alguns textos e ensino dos apóstolos.

            Precisamos pensar que é difícil Paulo pedir para os crentes julgarem a pregação em 1Co 14.29 se ele disse que o conteúdo dessa pregação deve ser a Palavra de Deus:

 

2 Timóteo 4:1-2 (ARA) 1 Conjuro-te, perante Deus e Cristo Jesus, que há de julgar vivos e mortos, pela sua manifestação e pelo seu reino: 2 prega a palavra, insta, quer seja oportuno, quer não, corrige, repreende, exorta com toda a longanimidade e doutrina.

 

2 Timóteo 4:1-2 1 Διαμαρτύρομαι οὖν ἐγὼ ἐνώπιον τοῦ θεοῦ, καὶ τοῦ κυρίου Ἰησοῦ χριστοῦ, τοῦ μέλλοντος κρίνειν ζῶντας καὶ νεκρούς, κατὰ τὴν ἐπιφάνειαν αὐτοῦ καὶ τὴν βασιλείαν αὐτοῦ, 2 κήρυξον τὸν λόγον, ἐπίστηθι εὐκαίρως, ἀκαίρως, ἔλεγξον, ἐπιτίμησον, παρακάλεσον, ἐν πάσῃ μακροθυμίᾳ καὶ διδαχῇ.

 

            Paulo usa o verbo grego κηρύσσω na expressão κήρυξον τὸν λόγον / “prega a Palavra” que significa “proclamar como arauto, pregar e proclamar algo”. O modo imperativo aoristo significa uma ordem urgente. Se a profecia para Paulo fosse a pregação da Palavra de Deus, ele colocaria em dúvida a própria Palavra de Deus, porque o objeto direto do verbo κηρύσσω é a ordem do verbo no imperativo aoristo: a Palavra (de Deus). Logo, ele estaria pedindo para julgar a Palavra de Deus. 

Depois, seria muita displicência de Paulo não alertar Timóteo que ele tivesse cuidado para que ele não fosse repreendido por outros profetas, pois Timóteo não era apóstolo nem profeta/apóstolo, mas apenas um pastor, filho na fé de Paulo. Além disso, Paulo fala de falsos mestres e jamais cita algum profeta no contexto. 

            Com respeito ao texto de Rm 12.3, seria uma grande tautologia de Paulo afirmar que o conteúdo, que ele já ensinou que deve ser a Palavra de Deus, fosse segundo a Palavra de Deus. Além do mais, teríamos que desprezar, inclusive, a palavra grega χαρίσματα usada para dons do Espírito Santo de 1Co 12 e 14. Portanto, seria um erro gravíssimo de hermenêutica e exegese para quem sabe grego.

            Alguns usam 1Ts 5.20, também, como pregação da Palavra de Deus. 

 

1 Tessalonicenses 5:20-21 (ARA) 20 Não desprezeis as profecias; 21 julgai todas as coisas, retende o que é bom;

 

Paulo estaria exortando os cristãos a não desprezarem a Palavra de Deus? Porque ele está falando da “profecia” e, se a profecia é a mensagem do profeta, então a Palavra de Deus deve estar inclusa, já que ele exortara que deveriam pregar “a Palavra” κήρυξον τὸν λόγον. O verso posterior (v.21) traz a mesma advertência de Paulo em 1Co 14.29, demonstrando que Paulo estava ensinando a profecia dom do Espírito Santo de 1Co 12; 14). Além do mais, Paulo colocaria a Palavra de Deus juntamente com “todas as coisas”? Acho muito difícil essa interpretação. 

 

2.3. A natureza do dom de profecia

 

            Precisamos saber, pelas Escrituras, em que consiste o dom de profecia. Muitos eruditos usam o verso 1Co 14.3 como se Paulo tivesse falando de características da profecia. No entanto, há um engano de interpretação e erro linguístico gravíssimo: a edificação, exortação e consolo não são características do discurso profecia nem fala dos tipos de discurso da profecia, mas são consequências e falam do resultado. Seria como se alguém dissesse que a característica do romance de Machado de Assis, Dom Casmurro, fosse a dúvida entre a traição de Capitu e o ciúmes de Bentinho. Claro que as características teriam que ser dentro do gênero do discurso do romance ou poema e que, no contexto, a profecia. Paulo está exortando que a profecia tem que ter como resultado a “edificação, exortação e consolo”, mas não está trazendo o que consiste a profecia. Paulo demonstra isso no contexto, vejamos:

 

1 Coríntios 14:26 (ARA) 26 Que fazer, pois, irmãos? Quando vos reunis, um tem salmo, outro, doutrina, este traz revelação, aquele, outra língua, e ainda outro, interpretação. Seja tudo feito para edificação.

 

1 Coríntios 14:31 (ARA) 31 Porque todos podereis profetizar, um após outro, para todos aprenderem e serem consolados.

 

            Notemos que, depois de Paulo falar dos vários discursos dos dons, ele ensina que tem que ser para “edificação” e ele ensina, ainda, que todos podem profetizar a fim de que sejam consolados. O texto demonstra propósito, alvo e resultado, não essência. Portanto, basear-se nesse texto para apontar para a pregação na igreja é quebrar a lógica linguística do discurso.

 

2.4. A profecia dom do Espírito Santo pode ser preditiva?

 

            Vários eruditos afirmam que a profecia do Novo Testamento não tem o caráter preditivo, baseando-se no erro linguístico de 1Co 14.3 já explicado. No entanto, não é isso que percebemos nos ensinos dos apóstolos que é a única regra de fé e prática que temos. Alguns defendem que não se pode pegar exemplos de Atos, nem das cartas de Paulo porque o Cânon ainda tinha sido fechado. Na verdade, quem defende isso fere fortemente a sua reputação de crer na inspiração das Escrituras e do Sola Scriptura para não citar mais coisas. Se o Atos e as cartas dos apóstolos não valem para certificarmos uma doutrina da Igreja de Cristo, seria qual base para vermos se um dom continuaria ou sabermos sobre sua natureza? Portanto, esse argumento deveria ser excluído de alguém que queira ter uma mente bíblica e queira preservar um argumento coerente da Bíblia como única regra. 

            Vejamos o que Paulo ensinou no próprio texto:

 

1 Coríntios 14:24-25 (ARA) 24 Porém, se todos profetizarem, e entrar algum incrédulo ou indouto, é ele por todos convencido e por todos julgado; 25 tornam-se-lhe manifestos os segredos do coração, e, assim, prostrando-se com a face em terra, adorará a Deus, testemunhando que Deus está, de fato, no meio de vós.

 

            Paulo fala em uma linguagem hipotética “se todos profetizarem e entrar algum incrédulo, tornam-se-lhe manifestos os segredos do coração”. Nesse texto, Paulo dá um aspecto do dom de profecia que é a manifestação “das coisas ocultas do coração” τὰ κρυπτὰ τῆς καρδίας. Alguém pode objetar que isso pode ocorrer na pregação, pois quando alguém ouve a Palavra de Deus, o Espírito de Deus fala de forma subjetiva ao coração do incrédulo. No entanto, o texto não está dizendo isso, mas afirmando que se tornam manifestos φανερὰ γίνεται. O adjetivo grego φανερὰ neutro plural na função de predicativo do sujeito, segundo Strong, quer dizer “algo manifesto claramente e evidente”. Logo, Paulo não está falando de subjetividade, mas de segredos ocultos revelados de forma evidente, clara e objetiva pela profecia. Por isso, esses incrédulos se prostrarão com a face em terra para adorar a Deus. Mas Paulo não para por aqui. Ele escreve:

 

1 Coríntios 14:29-31 (ARA) 29 Tratando-se de profetas, falem apenas dois ou três, e os outros julguem. 30 Se, porém, vier revelação a outrem que esteja assentado, cale-se o primeiro. 31 Porque todos podereis profetizar, um após outro, para todos aprenderem e serem consolados.

 

             Paulo fala de profetas porque ele deixa claro “tratando-se de profetas”. Ele ensina uma ordem no culto. Após, ele afirma: “Se, porém, vier revelação a outrem que esteja assentado, cale-se o primeiro” Ἐὰν δὲ ἄλλῳ ἀποκαλυφθῇ καθημένῳ, ὁ πρῶτος σιγάτω. No texto grego citado é mais fácil perceber que a profecia era preditiva também, pois o verbo ἀποκαλυφθῇ está na voz passiva que quer dizer “receber revelação (algo que está oculto e passa a ser revelado). Notemos que ainda está no contexto dos profetas, pois no verso 31 Paulo exorta que “todos podereis profetizar, um após outro, para todos aprenderem e serem consolados”. Uma possível objeção sobre isso pode acontecer ao afirmar que esse recebimento da revelação é da Palavra de Deus. Essa interpretação traz mais problemas aos cessacionistas porque vai dar a esses profetas a autoridade de receber revelação da Palavra de Deus, e isso pode ser muito perigoso. Depois, jamais Paulo iria ensinar que a Palavra de Deus fosse julgada, ao contrário, ele deixou claro que a Palavra que se originava entre eles era diferente da palavra do próprio apóstolo que era a Palavra de Deus (1Co 14.36-37).

 

1 Coríntios 14:36-37 (ARA) 36 Porventura, a palavra de Deus se originou no meio de vós ou veio ela exclusivamente para vós outros? 37 Se alguém se considera profeta ou espiritual, reconheça ser mandamento do Senhor o que vos escrevo.

 

2.4. O testemunho dos apóstolos sobre os profetas do NT

 

            Precisamos analisar como o apóstolo Lucas e Paulo receberam as profecias do NT. Isso é muito importante porque jamais Paulo estaria no grupo do “faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço”. Se não havia profecias preditivas, o Apóstolo dos Gentios deveria ter recusado ou jamais ter falado sobre esse tipo de profecia nas suas epístolas. 

 

O profeta Ágabo

 

Atos 11:27-30 (ARA) 27 Naqueles dias, desceram alguns profetas de Jerusalém para Antioquia, 28 e, apresentando-se um deles, chamado Ágabo, dava a entender, pelo Espírito, que estava para vir grande fome por todo o mundo, a qual sobreveio nos dias de Cláudio. 29 Os discípulos, cada um conforme as suas posses, resolveram enviar socorro aos irmãos que moravam na Judéia; 30 o que eles, com efeito, fizeram, enviando-o aos presbíteros por intermédio de Barnabé e de Saulo.

 

            Notemos que Lucas faz questão de escrever “naqueles dias”. Isso é muito esclarecedor em demonstrar que eram profetas do NT. Até porque fica difícil para quem tenha o mínimo de senso de hermenêutica afirmar que, depois da descida do Espírito Santo, ainda haja profetas do VT. O mais contundente é que a igreja recebeu a mensagem e aceitou mandando, como mensageiros, ninguém mais que os dois mais eminentes dos apóstolos, Paulo e Barnabé. Outro texto mais comprometedor envolvendo o apóstolo Paulo está em At 21.9-11:

 

Atos 21:9-11 (ARA) 9 Tinha este quatro filhas donzelas, que profetizavam. 10 Demorando-nos ali alguns dias, desceu da Judéia um profeta chamado Ágabo; 11 e, vindo ter conosco, tomando o cinto de Paulo, ligando com ele os próprios pés e mãos, declarou: Isto diz o Espírito Santo: Assim os judeus, em Jerusalém, farão ao dono deste cinto e o entregarão nas mãos dos gentios. 

 

            Lucas cita o testemunho de quatro filhas de Felipe que profetizavam, logo, está no contexto de profecia do NT. Ele continua falando novamente de Ágabo que traz uma nova maneira de falar “assim diz o Espírito Santo” diferenciando do VT que dizia: “assim diz o Senhor”. O profeta fala algo completamente preditivo e futurístico do que ia acontecer com Paulo. O apóstolo jamais duvidou e todos receberam como fidedigna essa palavra. Outro texto muito interessante é 1Tm 1.18; 4.14

 

1 Timóteo 1:18 (ARA) 18 Este é o dever de que te encarrego, ó filho Timóteo, segundo as profecias de que antecipadamente foste objeto: combate, firmado nelas, o bom combate,

 

            Paulo lembra Timóteo de profecias direcionadas a ele, ou seja, foi especificamente para Timóteo. Essas profecias não eram a Palavra de Deus porque se fosse, Paulo teria escrito de forma objetiva. No entanto, Paulo lembra seu filho na fé que combata o bom combate nelas, pois eram apenas “profecias” e que Paulo as julgou autênticas. A objeção de que essas profecias eram a Palavra de Deus revelada cai por terra, desde que não estão reveladas objetivamente no Cânon. Assim como algumas epístolas de Paulo não foram inspiradas pelo Espírito para serem consideradas Palavra de Deus. A inspiração tem um propósito de revelação objetiva escrita, ou seja, não podemos dizer que um texto foi inspirado se não foi revelado. Da mesma forma que João reconheceu que poderia haver muitos livros contando o que Jesus fez, mas Deus não os inspirou (Jo 21.35).

 

1 Timóteo 4:14 (ARA) 14 Não te faças negligente para com o dom que há em ti, o qual te foi concedido mediante profecia, com a imposição das mãos do presbitério.

 

            Nesta passagem, Paulo afirma que Timóteo recebeu um dom através de uma profecia em um evento de imposição de mãos. Tudo indica que foi na sua ordenação como pastor de Éfeso. E Isso confirma mais ainda que a profecia não era a pregação da Palavra de Deus por ser em um evento completamente improvável de pregação e que foi preditiva porque se referiu a algo que Timóteo não sabia e não tinha naquele momento da profecia. Portanto, seria algo muito bizarro não haver profecia preditiva e Paulo levar a Timóteo lembrar desse evento sabendo que suas palavras tinham o peso de Palavra de Deus.

 

Uma advertência às igrejas sobre profecias e profetas

 

            Nos nossos dias, muitas heresias, profetas e profecias estão sendo divulgadas pela internet. É necessário que os pastores estejam atentos a esses falsos profetas, hereges e heresias que vêm desses falsos obreiros e falsos profetas. No entanto, apesar do perigo, Deus inspirou sua Palavra e deu seus dons com um propósito para a sua glória. Deus jamais erraria nem jamais haveria qualquer traço de engano. Portanto, se ele revelou nas escrituras a profecia como um instrumento de edificação e, até, de aviso, precisamos estar atentos para isso.

            A igreja não pode recusar ou rejeitar o que Deus ofereceu a ela. Seriam líderes, pastores e teólogos mais sábios que Deus? No entanto, a igreja precisa entender que sempre quando Paulo fala de profecia, ele sempre faz questão de relacionar a um profundo exame para julgamento. Não se deve esquecer que os apóstolos alertaram sobre a prova dos espíritos (1Jo 4.1) e que “ainda nós ou um anjo vos pregue Evangelho além do que vos tenho pregado seja anátema” (Gl 1.8-9). Devemos ter a coragem de dizer a esses profetas, caso as doutrinas das Escrituras sejam agredidas e distorcidas, que o que eles dizem é anátema.

            Outra advertência muito séria é que a profecia não pode substituir ou prejudicar a pregação da Palavra de Deus. A profecia deve ficar muito antes como Paulo ensinou:

 

1 Coríntios 12:28 (ARA) 28 A uns estabeleceu Deus na igreja, primeiramente, apóstolos; em segundo lugar, profetas; em terceiro lugar, mestres; depois, operadores de milagres; depois, dons de curar, socorros, governos, variedades de línguas.

 

            O que deve ter a primazia é a doutrina dos apóstolos e profetas. A profecia não é a regra, mas a exceção porque Paulo ensina que o que deve ser pregado é a Palavra de Deus. No texto acima, Paulo enumera até o terceiro, para falar sobre o “depois”. Primeiro, os apóstolos, segundo, profetas (nesse caso são profetas designados como apóstolos distinto dos doze), terceiro, mestres; depois, serão os demais dons. Isso demonstra que Paulo ensina como um time de futebol com jogadores titulares e reservas. Há 3 titulares, a doutrina dos apóstolos e profetas, o ensino dos mestres, caso haja uma ação extraordinária, não programada, virá a profecia ou qualquer outro dom.

            Portanto, amados, devemos ter cuidado com o dom de profecia, para, ao mesmo tempo que não devemos rejeitá-lo por ser ensinado nas Escrituras, devemos ter o devido cuidado para não sermos enganados.

terça-feira, 11 de julho de 2023

A TEORIA DO DESIGN INTELIGENTE E A CONCEPÇÃO DE DEUS

 



            A designação da Teoria do Design Inteligente (TDI) começou nos USA em 1993 com o intuito de demonstrar que a Teoria da Evolução (TE) não podia explicar a complexidade e origem da vida. Um grupo de cinco cientistas cristãos, dirigido por um hábil advogado, Phillip E. Jonhson, resolveu enfrentar uma concepção científica de muitos anos, considerada o paradigma da Ciência e até de religiões.

         Phillip E. Jonhson e os demais cientistas começaram a escrever livros e artigos que questionavam diretamente a TE trazendo uma concepção de um design inteligente (DI) evidenciado na complexidade biológica e na complexidade de informação. O livro Darwin no Banco dos Réus, de  Phillip E. Jonhson, líder do grupo, demonstrou que Darwin que, para muitos, jamais deveria ser questionado, precisaria sentar no banco dos réus da Ciência e ser questionado pelas evidências. Logo depois, seguiu o best seller A Caixa Preta de Darwin, de Michael Behe, em que ele traz o conceito de complexidade irredutível, demonstrando várias evidências de insetos, coagulação do sangue e o flagelo bacteriano. Não menos importante, Stephen Meyer lança outro best seller chamado Signature in the Cell: DNA and the Evidence for Intelligent Design que trazia evidências de design inteligente na complexidade do DNAAssim, os demais cientistas escreveram outros livros e artigos em sites específicos, já que as revistas científicas e sites nos quais havia cientistas evolucionistas rejeitavam qualquer artigo nesse tema. No Brasil, já havia algumas manifestações de insatisfação com a TE em sites e blogs criacionistas entre os quais estava o de Michelson Borges. O mais destacado era o blog Desafiando a Nomenklatura Científica de Enésio de Almeida Filho. Neste blog, Enésio trazia vários artigos científicos e opiniões que questionavam a TE sem nenhum teor religioso. Nesse período, Adauto Lourenço fazia várias palestras em igrejas trazendo evidências do que ele chama de “Criacionismo científico” demonstrando, com argumentos científicos, a criação, o dilúvio e o início de tudo conforme a Bíblia. De forma bem modesta, em 2013, lanço meu livro Design Inteligente – A Metodologia de Convergência das Ciências sob a Ótica da Criação em que trago um histórico da TDI, problemas com a TE e fraudes em livros didáticos de Biologia, pois até aquele momento não havia livros escritos sobre isso em língua portuguesa.

         O ápice da TDI no Brasil foi o primeiro congresso na Universidade Mackenzie chamado Darwinismo Hoje que trouxe vários cientistas americanos do DI e da TE. Nesse congresso, vários debates foram feitos e, apesar de que a mídia não deu importância, havia uma notoriedade de um questionamento na academia e que também havia cientistas que questionavam a TE trazendo, como opção, uma teoria com base em evidências de complexidade irredutível, alta informação e antevidência, vindos de uma mente inteligente.

         Nesse contexto, surge um dos mais destacados cientistas no Brasil, Marcos Eberlin, doutor em Química e ganhador de vários prêmios em pesquisa de espectrometria de massa. Eberlin escreve dois livros ícones da TDI chamados Fomos Planejados e Antevidência. Neles, Eberlin traz evidências e aponta um dos pilares da TDI que é a antevidência biológica e química.

         No entanto, o nome de Deus não é citado em nenhum livro, artigo ou seminário da TDI porque há o temor de ser considerado uma teoria religiosa e por afirmarem que a TDI não pode chegar a uma conclusão do Deus bíblico, mas, no máximo, apenas o que eles chamam de “Uma Mente Inteligente”. Essa tarefa, afirmam, é somente para a filosofia ou para a Teologia. Os cientistas que falam de Deus e da Bíblia esclarecem de forma bem enfática que eles não falam pela TDI, mas apenas como pessoas religiosas. Há, inclusive, orientações sobre o cuidado de não tocar no nome de Deus em congressos ou trazer algum assunto que demonstre religiosidade. Explicam: a TDI não pode falar de Deus porque não há argumento para isso, embora que, de forma contraditória, alguns afirmem que possa ter uma Mente Inteligente. Dizem que não importa quem seja essa Mente Inteligente. Pode ser um ET, ou uma força cósmica, ou até alguém que seja deísta. Por isso, pode-se reunir várias pessoas com as suas várias concepções em congressos, mas jamais alguém deve falar o nome de Deus. Se alguém fizer isso, deve deixar claro que é apenas sua opinião religiosa ou filosófica, mas se falar em uma Mente Inteligente será científico, o Deus bíblico não é.

         Há cientistas do DI mais radicais. Eles nem consideram uma mente inteligente, mas apenas um Design Inteligente, um projeto como se viesse do país das Maravilhas, afirmando que, ao falar de Ciência, não se pode chegar nem a uma mente inteligente e muito menos ao Deus Bíblico. No entanto, é muito estranho que a Ciência para esses cientistas chegue somente ao design e não ao Designer ou ao Deus bíblico. Seria como se um legista examinasse um crime buscando evidências e trouxesse para serem examinadas pelos seus colegas e alguns digam: só podemos dizer que houve um crime, mas não que houve um autor; outros diriam: eu darei minha opinião, não como legista, mas como um cidadão, houve um homicídio e houve um autor, e muito inteligente pelas evidências. Outros diriam: houve uma mente inteligente, mas as evidências não podem nos levar ao autor porque isso é somente filosófico. Essa situação é muito semelhante a cientistas que não aceitam falar o nome de Deus em palestra da TDI. 

         

Problemas de não falar sobre o Deus Bíblico em palestras da TDI

 

Há vários problemas quando a TDI não chega à conclusão do Deus Bíblico. Problemas como falta de finalidade, contradição, afastamento do histórico da concepção de DI e, principalmente, nega o que o Criador escolheu para revelar a sua glória (Sl 19.1).

         O primeiro problema sobre essa concepção é a falta de finalidade porque a TDI fica apenas uma teoria pela teoria, ou seja, ela fica com a finalidade apenas em torno de si mesma. Ela servirá apenas para simplesmente refutar a TE e nada mais. O seu propósito, no fim de um congresso de TDI, é, apenas, saber que a TE é uma teoria que não explica a complexidade da vida ou do universo. Não importa se alguém apenas se contente no Design Inteligente ou tenha, como conclusão filosófica, que essa complexidade venha de uma mente inteligente, ou que uma pessoa religiosa diga que foi o Deus bíblico, ou até que alguém diga que foi um ET, como alguns afirmam que poderia ter sido, ou até um alienígena dos Transformers vindo de um outro planeta. No entanto, é digno de nota que esses ET’s, alienígenas e qualquer que seja essa Mente Inteligente precisam ter as mesmas características do Deus bíblico, e isso se torna muito irônico.

         Diferente dos cientistas da TDI, os cientistas ateus e militantes ateístas usam a TE com propósito para demonstrar que Deus não existe. As revistas científicas não têm nenhuma dificuldade em evocar a TE para falar de Deus, só que para negar a sua existência. Richard Dawkins é seu principal expoente. Biólogo e ateu militante, ele evoca em suas palestras, livros, aulas e artigos a TE como base para o ateísmo. Pode-se perceber pelos seus livros: Deus, um delírio; A Grande História da Evolução; O Relojoeiro Cego; O Gene Egoísta e outros. Todos eles citam Deus abertamente como delírio, relojoeiro cego e ele usa exatamente a TE para defender seus argumentos. O próprio Dawkins, em seu livro O Gene Egoísta, explora a ideia de que a seleção natural e a evolução podem explicar a diversidade e a complexidade da vida sem a necessidade de um criador sobrenatural.

No entanto, ao contrário de Dawkins, os cientistas da TDI evitam falar em Deus em seus artigos, livros e palestras em congressos, exceto, se estiverem em uma igreja ou em debates deixando claro que não falam mais como cientistas da TDI.

         O segundo problema com essa concepção é porque ela se torna completamente contraditória porque se alguém se recusa a falar de Deus por dizer que a TDI jamais pode chegar à conclusão do Deus da Bíblia por ser um assunto filosófico e religioso, jamais poderá usar, como argumento, a TDI para comprovar a existência do Deus Bíblico. Se alguém fizer isso entrará em um labirinto de contradição porque colocaria o argumento da existência de Deus como não válido dentro de uma concepção objetiva e científica para usá-lo como argumento objetivo e científico. Para exemplificar, seria uma descrição do silogismo:

 

TDI = NÃO CONCLUSÃO OBJETIVA DE DEUS 

PROVA DA EXISTÊNCIA DE DEUS = ARGUMENTOS OBJETIVOS

PROVA DA EXISTENCIA DE DEUS = NÃO TDI

 

A Descrição da lógica é exatamente que a TDI jamais poderá usar o argumento para a existência de Deus se ela despreza os argumentos científicos para a conclusão da existência de Deus. Seria uma tremenda contradição. E um ateu bem atencioso poderá perceber isso claramente.

Terceiro, essa tendência se afasta completamente do histórico da concepção do DI. Apesar de que a TDI começou em 1993 em Pajara Jones, nos

USA, essa concepção de DI incluindo a ideia de Deus começou muito antes com William Paley. Em meu livro exponho sobre esse detalhe assim:

 

No séc XVIII, William Paley lança seus livros de grande influência na época Evidences of the Christianity (evidências do Cristianismo) e Natural Theology (Teologia Natural). Sua influência foi tão grande que alcançou o próprio Darwin. Paley era eminente teólogo e filósofo da sua época. Suas obras foram best-seller durante vários anos a ponto de entrar no século XIX e influenciar fortemente o pensamento de Darwin, mesmo que depois ele tenha seguido pelo caminho do naturalismo. Darwin mesmo admite em sua autobiografia que os argumentos de Paley foram inicialmente convincentes. Não é difícil perceber no livro de Darwin, a Origem das Espécies, a influência dos argumentos do design inteligente de William Paley. John Angus Campbell, falando do design inteligente, expõe a grande influência que Darwin teve de William Paley e do design inteligente. Ele afirma: “Como um estudante de divindade em Cambridge, Darwin obteve uma profunda exposição de oposição da visão naturalista, fazendo fortes declarações para o papel de um designer inteligente em uma mais apropriada e vagarosa atmosfera, onde Darwin estava entre os jovens homens de sua própria classe. Ele desenvolveu um estreito relacionamento com o reverendo John Stephens Henslow, professor de botânica. Sob a direção de Henslow, Darwin participou de cursos de ciência sem muito crédito e leu Evidências do Cristianismo e Teologia Natural de William Paley.” (MAGALHÃES, 2020, p. 72)[1]

 

                  William Paley deixava claro em suas duas obras que por trás de uma criação não estava apenas uma mente inteligente vazia sem uma identidade. Para William Paley, o que estava por trás da criação era o que ele chamou de “Criador”, referindo-se ao Deus bíblico, a quem ele chamou também de “Artífice”. Na verdade, pelo próprio título de seus livros, Paley demonstra claramente que não temia falar de Deus como Criador em suas teses, pois os títulos “Evidências do Cristianismo” e “Teologia Natural” já deixa claro que ele tinha um compromisso com a visão de incluir o Criador com os atributos do Deus bíblico. O mais interessante é que o expoente da TE, Charles Darwin, baseou-se nele para suas pesquisas na sua grande viagem ao redor do mundo.

         William Paley foi tão importante que Richard Dawkins defende o seu ateísmo escrevendo um livro com base no argumento de Paley chamado “O Relojoeiro Cego”. 

Além de tudo isso, Paley não está sozinho em aceitar Deus na natureza e em suas conclusões cientificas, pois Albert Einstein, criticando ateus, afirma: “perante tamanha harmonia do cosmos existem pessoas que dizem que não há Deus” (ANDREW, 2005, P. 186)[2]. Ainda nesse contexto, Andrew (2005, p. 186) afirma, trazendo textos de Stephen Hawking, Arthur C. Clackr, Philip Glass e outros:

 

Einstein chamou sua convicção religiosa de um "sentimento religioso cósmico" e afirmou que se tratava "do motivo mais nobre e mais forte para a pesquisa científica", como mostraram Kepler e Newton. Portanto, ciência e religião estão conectadas tão intimamente que "a ciência sem a religião é manca, e a religião sem a ciência é cega" 

 

         Se Einstein, um dos maiores ícones da Ciência Moderna, que não era cristão, não tinha temor de falar de Deus, por que um cientista que conhece e crê nas Escrituras teria na sua cátedra e em suas palestras? De qualquer forma, Einstein jamais falou em igrejas nem em podcast’s religiosos. Ao contrário, toda declaração dele tinha o valor de um prêmio Nobel de física e do autor da Teoria da Relatividade.

         Quarto e último problema da concepção de não falar o nome do Deus bíblico é exatamente porque não leva em conta o que o próprio Deus revelou na sua Palavra através dos profetas e apóstolos. Dois textos demonstram isso:

         O primeiro texto é Salmo 19.1

 

Os céus proclamam a glória de Deus, e o firmamento anuncia as obras das suas mãos.

          

         O salmista usa duas palavras hebraicas para demonstrar seu argumento da revelação da glória de Deus. A primeira palavra é שָׁמַיִם shamaym que, segundo Strong, significa “firmamento, universo visível”, e a segunda palavra é רָקִיעַ raqiya’ “o firmamento expandido, o lugar onde ficavam as águas de cima”. Percebe-se que o salmista não usa nenhum argumento religioso ou filosófico para falar da revelação da glória de Deus, mas ele fala da natureza e de sua complexidade. O salmista argumenta também que a percepção de mundo e complexidade não é apenas uma ilusão como afirmam neoateístas, pois o salmista evoca exatamente essa percepção para demonstrar a glória de Deus.

         O segundo texto é Romanos 1.19-20

 

19 porquanto o que de Deus se pode conhecer é manifesto entre eles, porque Deus lhes manifestou. 

20 Porque os atributos invisíveis de Deus, assim o seu eterno poder, como também a sua própria divindade, claramente se reconhecem, desde o princípio do mundo, sendo percebidos por meio das coisas que foram criadas. Tais homens são, por isso, indesculpáveis; 

 

19 διότι τὸ γνωστὸν τοῦ θεοῦ φανερόν ἐστιν ἐν αὐτοῖς· ὁ γὰρ θεὸς αὐτοῖς ἐφανέρωσεν.

20 Τὰ γὰρ ἀόρατα αὐτοῦ ἀπὸ κτίσεως κόσμου τοῖς ποιήμασιν νοούμενα καθορᾶται, ἥ τε ἀΐδιος αὐτοῦ δύναμις καὶ θειότης, εἰς τὸ εἶναι αὐτοὺς ἀναπολογήτους·

         

         O contexto é que o apóstolo está falando sobre o motivo da ira de Deus sobre toda a humanidade. Ele começa o verso 19 com uma conjunção causal διότι afirmando que a causa da ira de Deus é exatamente por que o conhecimento de Deus τὸ γνωστὸν τοῦ θεοῦ é manifestado, sendo ele mesmo que o fez. Esse adjetivo substantivado γνωστὸν tem o significado de conhecimento notável, perceptível e que se pode racionalizar. O verso 20 explica o anterior demonstrando qual foi esse conhecimento que Deus manifestou sobre si mesmo. Paulo afirma que foram os seus atributos, escrito no original para suas coisas invisíveis Τὰ γὰρ ἀόρατα αὐτοῦ, deixando claro pela segunda parte do verso que são seus atributos. O apóstolo afirma que os atributos de Deus são percebidos claramente, pois o verbo grego καθοράω demonstra uma visão clara e perceptível. Ele ainda usa outro verbo que demonstra racionalização mental que é o verbo νοέω vindo do substantivo νους, que significa mente e suas faculdades mentais. Paulo ainda afirma que esses atributos são percebidos desde a criação do mundo pelas coisas criadas. Ele faz duas declarações: a primeira é que o mundo foi criado; segunda, ele usa a palavra grega ποιήμα poiêma que significa coisa criada com arte e inteligência. Dessa palavra que vem a palavra portuguesa “poema”. Isso demonstra que Deus criou todas as coisas exatamente para demonstrar sua sabedoria, inteligência e design.

         Na segunda parte do verso, Paulo explica quais atributos são percebidos por essas coisas criadas de forma inteligente e artística. Ele revela dois grandes atributos que é “o seu eterno poder” ἥ τε ἀΐδιος αὐτοῦ δύναμις e a sua divindade θειότης. Ele completa o verso demonstrando o propósito dessa manifestação clara do Criador que é exatamente para que os homens sejam indesculpáveis ἀναπολογήτους. Essa palavra vem de um prefixo negativo ἀν e ἀπολογία que significa “defesa, argumento”. Portanto, Paulo afirma que, pela qualidade e clareza da revelação, os homens são indesculpáveis, sem condição alguma de argumento ou defesa.

         As palavras “eterno poder” significa que toda a criação do cosmos só se explica se aceitarmos que o seu criador seja eterno e todo-poderoso. Portanto, para que o tempo e o espaço tenham sido criados, seria necessário que essa Mente inteligente tenha o atributo da eternidade e tenha um poder total. Cada parte do cosmos com a sintonia finíssima e cada máquina biológica nanométrica revelam que há uma conclusão lógica de um Criador eterno e todo poderoso.

         A palavra divindade θειότης demonstra que não há espaço cognitivo para ET’s, Força Cósmica, ou, até, neutralidade, porém, a criação de Deus revela a identidade do Criador que é o Deus Eterno com todos os atributos da divindade.  

         Portanto, Deus criou tudo de forma que os seres humanos possam desfrutar e perceber sua sabedoria, inteligência e poder.

 

Falácias usadas contra aqueles que usam o conceito do Deus bíblico

 

         Uma das razões de alguns cientistas e acadêmicos temerem a falar sobre Deus e até na Bíblia quando defendem o DI é exatamente porque quem os refuta faz uso de várias falácias nos seus argumentos. A primeira falácia é achar que a Bíblia é um livro apenas religioso e deve cumprir somente a função de rituais eclesiásticos. No entanto, a Ciência nunca está à margem da Filosofia nem de algum pensamento que a Bíblia não evoque. Por exemplo: criação de todas as coisas, complexidade biológica e planejamento da natureza. 

         Todo cientista deve partir de uma ideia, seja no aspecto filosófico, seja no aspecto da visão da Bíblia. Talvez por isso, Einstein pode dizer que “a ciência sem a religião é manca, e a religião sem a ciência é cega”. Todo cientista deve partir de uma visão abstrata do que ele percebe para fazer suas hipóteses a fim de comprová-las, o que Emanuel Kant chamou de “o elemento da universalidade”. 

         Kant colocou em dúvida todo o poder do racionalismo e do empirismo, pois, todos esses métodos dependem de uma percepção de suas próprias experiências que não podem ser provadas, e, mesmo que tentem, a conclusão será sempre tendenciosa diante do sujeito. Para isso, Kant sugere o criticismo da razão, o que ele chamou “a crítica da razão pura”. Portanto, 

 

Kant observa em seguida que a raiz última dos erros do racionalismo e do empirismo é a concepção errônea do conhecimento humano.
O racionalismo sustenta que o conhecimento procede só do sujeito; o
empirismo afirma que ele vem só do objeto; como o objeto pode fornecer só a novidade e o sujeito, só a universalidade, a ciência torna-se impossível.


 

Ora, o conhecimento não é fruto nem do sujeito, nem do objeto, mas é a síntese da ação combinada do sujeito e do objeto: o sujeito
dá a forma, o objeto, a matéria; o conhecimento é o resultado de um
elemento a priori (o sujeito), e de um elemento a posteriori (o objeto): os juízos que o exprimem já não são apenas analíticos ou só sintéticos, mas também sintéticos a priori.
(MONDIN, 1981, p. 174)[3]

 

         Portanto, segundo Kant, o conhecimento não é algo simples que dependa apenas da razão (racionalismo) ou da experiência (empirismo). O conhecimento precisa de uma crítica em buscar leis universais, “de modo a manter sob controle determinadas tendências naturais da psique, a começar pela propensão a generalizar casos concretos, formulando leis universais de valor metafísico, não verificáveis pela experiência” (NICOLA, 2005, p. 323)[4]. Apesar de que Kant não tinha a intenção de destacar alguma revelação da Bíblia, somente esta se enquadra dentro das características das “leis universais de valor metafísico, não verificáveis pela experiência”. 

         O segundo filósofo a questionar o racionalismo científico é Karl Popper. Ele trouxe à teoria científica o que ele chamou de “falseabilidade”. Para Popper, uma teoria fica somente nas ideias, apenas no ponto de vista psicológico, entrando, assim, em um nível de fé até passar pelo teste da falseabilidade. Ele escreveu:

 

Encarando a matéria do ponto de vista psicológico, inclino-me a pensar que as descobertas científicas não poderiam ser feitas sem fé em ideias de cunho puramente especulativo e, por vezes, assaz nebulosas, fé que, sob o ponto de vista científico, é completamente destituída de base e, em tal medida, é “metafísica”. (POPPER, 2007, P. 40)[5]

 

Ele cita Einstein, com quem trocou correspondências sobre muitos assuntos, afirmando uma frase de sua autoria: 

 

(...) a busca daquelas leis universais (...) com base nas quais é possível obter, por dedução pura, uma imagem do universo. Não há caminho lógico que leve a essas leis. Elas só podem ser alcançadas por intuição, alicerçada em algo assim como um amor intelectual aos objetos de experiência. (POPPER, 2007, p. 32)

 

         Para Popper, o que chamam de científico por uma simples racionalização de teorias, não passa de um tipo do que ele chamou de psicologismo. Isso significa que o que muitos chamam de razão científica, muitas vezes, não passa de especulações com a mesma qualidade de fé ou, até, de fideísmo. Logo, cientistas usam o mesmo método que qualquer pessoa religiosa usa. A diferença está na base de suas hipóteses: ou no materialismo, ou na Bíblia. 

 

A falácia do Espantalho

 

         A falácia do espantalho é usada para desviar o argumento do opositor. Para isso, usa-se um argumento que, embora esteja dentro do escopo do tema falado, não responde em nada ou não refuta em absoluto a proposição defendida. Quem usa essa falácia interpreta mal o argumento do opositor enfatizando algo que ele não quis defender. Para quem não conhece esse falso argumento, é surpreendido pelo argumento do oponente com questões complexas que até são dignas de reflexão ou de debate, mas foge do argumento principal.

         Uma das falácias do espantalho para refutar aqueles que falam de Deus no DI é fazer a pergunta clássica dos adolescentes: “quem criou Deus?”. Quem faz essa pergunta acha que o embaraço da resposta refutaria o fato de citar Deus como o autor do Design. No entanto, jamais refuta porque, independente se Deus foi criado ou não, esse argumento jamais refuta que o DI traz evidências claras de um ser todo-poderoso e todo-sábio. Seria como se alguém questionasse se um relógio teve um criador perguntando se o autor nasceu de parto normal ou cesariano. 

         Independente da resposta filosófica, perguntar quem criou Deus seria como se perguntasse a um professor de matemática qual o último número do infinito? Se soubéssemos qual seria esse número, já não seria infinito, mas finito. Deus não teve princípio e jamais foi criado. Esse atributo até o ratifica como criador do universo e de tudo que existe porque somente um ser atemporal e que transcenda o espaço poderia ter a sabedoria e o alcance de criar todas as coisas que estejam relacionadas em sintonia finíssima do macro e micro da natureza.

         Outra falácia do espantalho para a ideia de incluir Deus nos argumentos do DI são os chamados Bad Design. Esse argumento tenta demonstrar que não se pode dar crédito a um Deus que faça um desing defeituoso e, por isso, eles entendem que Deus estaria sendo mal colocado e até trazendo problema à teoria do DI. No entanto, esse argumento não argumenta em nada a autoria do Deus bíblico. O bad design não desfaz a inteligência de um projetista ou se o projeto tem características de inteligência de um criador Deus porque não deixa de ser design. Seria como alguém que achou um relógio em um campo com defeito e chegasse a uma conclusão que não houve autor, mas apenas acaso por causa de um defeito.

         Existem três motivos para um design errado: o primeiro é quando o autor faz o desing errado por ele ser limitado; o segundo motivo é pelo desgaste de quem usa o design; e o terceiro, pode ser por um propósito daquele que o fez. É muito difícil para quem criou com tanta perfeição o universo tenha errado nos seus designs. Seria como se alguém esperasse a Apple criar um tipo de Iphone sem a função de telefonar ou entrar na internet porque os engenheiros não conheciam com perfeição essa função ou outra essencial para um telefone. Pela grandeza da sua criação, esse Criador jamais faria algo errado por não ter capacidade. No entanto, resta apenas uma opção óbvia e lógica: Deus tem o propósito de que exista os bad design

         Além disso, muitos dos que chamam de bad design desconhecem suas funções reais e, por não saberem, designam como tal. Como exemplo, tem-se o chamado DNA Lixo, o polegar do Panda e o apêndice. O que, antes, cientistas caracterizavam como inúteis por não terem função específica, descobriu-se exatamente porque não sabiam sobre elas. De qualquer forma, percebe-se propósito até nos bad design, pois, a inteligência humana nos dá exemplo de que são feitas algumas coisas com o propósito de limitar ou coibir algumas ações que o autor não queira. Por exemplo, um carro que dá sinal sonoro por não colocar o cinto de segurança, pode ser considerado bad design para um cliente que não goste de usar cinto e se incomode com o sinal sempre que ele entre no carro. Da mesma forma, alguém que use um aplicativo que, sempre antes de confirmar alguma coisa, apareça uma mensagem de “tem certeza? Sim ou não?”. Logo, alguém pode considerar tudo isso um bad design e até dizer que foi mal projetado, no entanto, o criador teve uma intenção específica sobre isso. 

 

 

 

 

A falácia da ambiguidade

 

         Essa falácia é usada para explorar o equívoco do significado de palavras ou sentenças as quais são usadas fora de contexto. Isso acontece para desqualificar o argumento evidenciando apenas a palavra com má interpretação.

         A falácia da ambiguidade é usada àqueles que seguem evocando o nome de Deus ou falam da Bíblia, sendo caracterizados como “religiosos”, e, para esses, são repetidos chavões como: “DI é Criacionismo disfarçado”; “é religião”; “todos são religiosos, por isso falam de Deus”. No entanto, todos esses chavões jamais argumentam, com evidências, o DI, porém, tentam desviar o foco para o aspecto da religião cujo valor, para esses, é diminuído afirmando que usam um salto de fé em um livro religioso. No entanto, para esses, a religião e filosofia perdem valor em qualquer debate apenas por uma convenção falaciosa sem nenhum argumento lógico. Afinal de contas, por que qualquer relação com a ideia de Deus ou religiosa perderiam valor de argumento sendo que são acompanhados com evidências científicas? 

         Essa falácia é refutada ao distinguir o verdadeiro conceito de religião e de fé. Se o conceito de “religião” for o discurso que trata dos aspectos da transcendência, da origem de todas as coisas, existência de Deus, da relatividade da validade cognitiva da Bíblia; os cientistas ateus são os mais religiosos do mundo. Portanto, evocar esses temas em evidências científicas não pode desqualificar um estudo somente por isso, até por que jamais Richard Dawlkins foi desqualificado ao evocar, em suas obras, mesmo de forma negativa, o nome de Deus.

         A segunda falácia da ambiguidade é a acusação que o DI é uma “pseudociência”. Precisa-se pensar os conceitos de ciência e seu limite para que ela seja o que reivindica ser. Ciência é toda pesquisa formulada, com suas hipóteses testadas, aprovadas e rigidamente observáveis, deixando de ser teoria para ser um dado demonstrável e repetido por qualquer dos pares. Por exemplo, o DI tem hipóteses testadas por observação com a informação de alto nível no DNA; a complexidade do flagelo bacteriano; o trabalho do RNA Mensageiro levando informação à Mitocôndria para que sejam geradas as proteínas necessárias à vida, demonstrando inteligência em suas funções, complexidade irredutível e antevidência como características de um Criador muito sábio e eterno. Portanto, esse prefixo “pseudo” não condiz com a ciência no DI.

 

Conclusão

 

         Os cientistas do DI precisam evocar o nome de Deus nas suas palestras para que o argumento de um Design Inteligente seja completo. Deixar no ar apenas que há um design inteligente sem se preocupar com o Designer ou quem seja esse Designer é como se pesquisadores encontrassem um livro escrito em Marte e se contentassem apenas em dizer: “não queremos saber os atributos de quem escreveu esse livro; apenas que há uma evidência de design. Não nos importamos com as características desse personagem; no máximo, que houve uma mente inteligente muito vaga”. 

         Precisa-se pensar que Deus deixou o universo compreensivo para que ele seja notado e revelado, pois “os céus proclamam a glória de Deus e o firmamento anuncia as obras de suas mãos” (Sl 19.1) e que Jesus ensinou que “qualquer que de mim e das minhas palavras se envergonhar, dele se envergonhará o Filho do Homem, quando vier na sua glória e na do Pai e dos santos anjos” (Lc 9:26). 



[1]MAGALHÃES, Francisco Mário Lima. Darwinismo, Design Inteligente e Educação. São Paulo: Reflexão, 2020.

[2] ANDREW, Robinson. Einstein: os 100 anos da Teoria da Relatividade. Rio de Janeiro: Elsevier, 2005, p. 177.

 

[3] MONDIN, Batista. Curso de Filosofia: os filósofos do Ocidente. São Paulo: Edições Paulinas, 1981.

[4] NICOLA, Ubaldo. Antologia ilustrada de Filosofia: das origens à idade Moderna. São Paulo: Globo, 2005.

[5] POPPER, Karl. A Lógica da Pesquisa Científica. São Paulo: Cultrix, 2007.