Nestes últimos anos o ataque à dádiva do dízimo tem se intensificado muito. Isso se deve a dois motivos: o primeiro é devido aos vários ataques à institucionalização da igreja. Se não existe igreja institucionalizada, o dízimo se torna inviável e inadequado, já que ele tem por objetivo de suprir as necessidades, principalmente dos obreiros e serviços nos lugares de culto.
O segundo motivo se deve a total leviandade como algumas igrejas neo-pentecostais tratam essa dádiva. O comércio do Evangelho, a exploração da fé, o esbanjamento de pastores da prosperidade e os escândalos envolvendo dinheiro têm levado, mais do que nunca, alguns questionarem o uso do dízimo na igreja.
Precisamos, mais uma vez, deixar claro que os pastores que questionam o uso do dízimo na igreja de hoje usam de muita sinceridade; porém, sinceridade não é sinônimo de correto. No entanto, precisamos entender que por alguns usarem o Evangelho e o dízimo de uma forma inadequada e comercial, não significa que estes sejam errados, mas precisamos analisar de uma forma bíblica e exegética se de fato é assim.
O objetivo desse ensaio é exatamente analisar de uma forma bíblica e exegética a dádiva do dízimo e trazer um maior conhecimento às pessoas que questionam se de fato o dízimo é para os nossos dias. Pretendo analisar o dízimo no NT e o que os apóstolos ensinaram sobre isso.
Um dos grandes questionamentos em relação ao dízimo é se ele é para nós obedecermos ainda hoje. Alguns defendem que o dízimo, à semelhança das leis cerimoniais e civis, foram somente para Israel. Dentre esses que defende essa interpretação está o Pr. Ed Rene Kivitz. Em seu artigo ele ensina que o dízimo, à semelhança do Sábado e das leis cerimoniais, foi apenas para “uma disciplina temporária, até que o povo aprendesse que a Deus pertence ‘toda a prata e todo o ouro’ (Ageu 2.8)”. Ele ainda afirma: “No Antigo Testamento Deus estava prioritariamente associado a um lugar (o Templo), um dia (o shabat), uma atividade (o culto) e um grupo de pessoas (os sacerdotes)”. No entanto, ele completa: “mas no Novo Testamento ‘Deus não habita em templos feitos por mãos humanas’ (Atos 7.48,49), já não se deve julgar ninguém pelos ‘dias de festa ou sábados’, pois todos os dias são iguais (Romanos 14.5,6; Colossenses 2.16,17) e todos são sacerdotes (1Timóteo 2.5; 1Pedro 2.9,10)”.
Podemos até entender o critério hermenêutico do Pr. Kivitz porque realmente o VT precisa ser interpretado levando em conta o NT. Somente podemos dizer que algo do VT é obsoleto se o NT ensinar isso. Realmente as leis cerimoniais de serviço do templo e a guarda de dias e festas foram cumpridas em Cristo, pois tudo isso foi sombra do verdadeiro que é Cristo. Verdade também que todos nós somos sacerdotes reais em Cristo Jesus e ninguém pode ser privilegiado em relação ao acesso à presença de Deus. No entanto, o Pr. Kivitz não levou em conta algumas nuances importantes do dízimo que são decisivas para interpretarmos o seu uso para os dias atuais.
O dízimo aparece pela primeira vez no VT com Abraão em sua dádiva a Melquisedeque como uma manifestação de aliança (Gn 14.18-20). O dízimo não era costume somente dos israelitas, mas outros povos já faziam essa prática como adoração a seus deuses em aliança. Segundo o DITNT:
Na Babilônia, durante o reinado de Nabucodonosor II, todos, inclusive o rei, pagavam um dízimo da terra ao templo, e, ao mesmo tempo, os reis babilônicos cobravam o dízimo de todas as importações. Os sátrapas persas também exigiam o dízimo das importações. Ciro, o persa, no entanto, obrigou seus soldados a darem a Zeus o dízimo dos seus despojos. Pausânias (século II d.C.) dá muitos exemplos da Grécia e de Roma de um dízimo como imposto sobre as terras, que ocasionalmente se dedicava aos deuses. [1]
Abraão entrega o seu dízimo a Deus em gratidão através de Melquisedeque que abençoa a Abraão. O dízimo foi entregue não como um mandamento, mas como um sinal de aliança entre Abraão e Deus através de Melquisedeque. O autor aos Hebreus repete esse episódio para falar do sacerdócio eterno de Melquisedeque e que ele foi um tipo de Cristo (Hb 7.1-10). O autor aos Hebreus confirma que o encontro entre Abraão e Melquisedeque foi uma aliança sacerdotal, pois Abraão pagou o dízimo pelos filhos de Levi (Hb 7.9). Na verdade, a linguagem dessa passagem é de aliança entre Abraão e Melquisedeque, tendo o sacerdote Melquisedeque aquele que liderava a aliança e a bênção, pois foi ele que abençoou a Abraão. Partindo desse detalhe, não se pode analisar o dízimo como uma lei cerimonial ou civil apenas porque foi feito muito antes dessas leis.
Apesar de que o dízimo foi colocado na lei para Israel entre as suas muitas leis cerimoniais, Abraão já tinha demonstrado que ele é um relacionamento de aliança entre Deus e seu povo, pois veio muito antes da lei.
No entanto, alguém pode argumentar que o sacrifício de animais veio também antes da lei levítica do holocausto. Porém, o sacrifício de animais se cumpriu em Cristo, claramente demonstrado no NT (Jo 1.29; 36; At 8.32; 1Pe 1.19; Ap 5.6) . Ao contrário do sacrifício de animais, que tipificava Cristo, o dízimo não é ensinado que se cumpriu no NT, mas, ao contrário, os apóstolos o confirmam, embora que não tenha sido de uma forma muito explícita como iremos explicar.
Moisés sendo autor do Pentateuco e inspirado pelo Espírito Santo para escrever esses livros sabia por que colocou esse episódio antes mesmo da lei. Quando Moisés escreveu o Pentateuco, sabia que estava tratando de um povo contaminado pela natureza caída do pecado e avarento. A natureza humana continua a mesma e precisamos saber que estamos em aliança com o Deus de Abraão firmada pelo sangue do Cordeiro de Deus e, à semelhança de Melquisedeque, precisamos entregar ao Senhor daquilo que temos, pois Deus é o Senhor de toda a terra, não somente no VT, mas em todo o tempo (Sl 24.1).
Quando o Pr. Kivitz afirma que o dízimo era somente por um período para que o povo aprendesse a solidariedade, ele subestima a natureza do pecado em todos os tempos. A mesma natureza egoísta e avarenta continua na nova aliança e ela precisa da mesma disciplina e isso através da dádiva do dízimo.
É verdade que Deus não está ligado mais a um templo ou local, não precisamos mais de um dia da semana e que todos os santos são sacerdotes reais da nova aliança. Não obstante a tudo isso, não podemos esquecer que precisamos de um local de reunião e adoração e isso tem custo (1Co 11.34); que precisamos de um dia para isso (At 20.7; 1Co 16.2) e que os pastores e obreiros devem ser dignos de dobrados honorários, sendo o trabalhador digno de seu salário (1Ti 5.17; Lc 10.7). Esquecer isso é tratar o assunto com muito simplismo e esquecer as necessidades da igreja institucionalizada.
b) O dízimo traz um mandamento moral
Outro aspecto que se deve levar em conta para a permanência do dízimo para a igreja de hoje é que quando Deus fala do dízimo em Ml 3.8-10 ele afirma que o povo o estava roubando. O furto e o roubo eram claramente leis morais e pecados (Ex 20.15; Lv 19.13). Todos sabemos que as leis morais sempre permanecerão diante de nós para que observemos, mesmo no NT (Mt 19.18; Rm 13.9; Ef 4.28). Embora que não fazemos isso para sermos justos, pois o justo viverá pela fé, mas para crescermos em santificação.
Quando Deus falou a Israel através do profeta que eles o estavam roubando quando deixavam de dar os dízimos e as ofertas, Deus estava associando essa transgressão a uma lei moral e, portanto, trazendo um princípio para a igreja em todos os tempos e épocas. Mesmo que entendamos que toda transgressão das leis cerimoniais e civis trazia uma quebra da lei moral indiretamente, mas essa está explícita e bem enfatizada.
Não obstante a isso, alguém pode defender que Deus falou que era roubo somente naquela circunstância e que no momento atual não é. Porém, para se afirmar isso teríamos que ter claramente um ensinamento do NT acerca da transitoriedade do dízimo como temos do sábado e de alimentos como Jesus e Paulo ensinaram, já que se trata de algo muito sério, pois o pecado era contra o próprio Deus. Portanto, qual a base para se dizer que isso deixaria de ser roubo, sendo que o NT continua condenando o roubo e o furto, e que o NT não nos dá base para que deixemos de dar o dízimo? Para aqueles que advogam e aceitam somente as ofertas voluntárias na igreja, não podem esquecer que nessa passagem também fala das ofertas (Ml 3.8). Diante disso, mesmo assim, o texto não é levado em conta? Se o texto é levado em conta só para as ofertas, por que também não é para o dízimo?
Malaquias também falou sobre o divórcio, a infidelidade conjugal e a violência (Ml 2.15,16). Todos esses pecados são ainda considerados no NT, mesmo levando em conta a diferença conjuntural e circunstancial da passagem. No entanto, esses princípios são levados em conta e ninguém questiona que é somente para o VT, mesmo percebendo que Paulo foi também muito reticente no que diz respeito ao divórcio no geral, falando somente de apenas um caso e não tocando na cláusula excetiva que Jesus falou nos Evangelhos.
Se aceitarmos como pecado o que Malaquias falou sobre o divórcio, a infidelidade conjugal e a violência no cap. 2.18,19, por que não aceitaríamos sobre o roubo ao Senhor, pois é a única passagem na Bíblia que fala do roubo a Deus. Geralmente o roubo é contra o próximo, mas a passagem de Malaquias fala do pecado contra o próprio Deus. Por isso, a palavra hebraica usada por Malaquias no verso 8 é ‘adam (homem). Deus faz a pergunta ao homem, mostrando uma certa universalidade e algo enfático: homem finito roubando o Deus Infinito. Portanto, que autoridade temos de chamar obsoleto uma transgressão contra o próprio Deus? Principalmente quando o NT não nos autoriza para tal coisa? Isso é loucura!
Portanto, a resposta à pergunta do tema é exatamente que o dízimo não é somente para o VT, mas para a igreja de todos os tempos e épocas, já que se trata de um relacionamento de aliança entre Deus e o homem ensinado por Moisés antes da revelação da Lei mosaica e que se trata de um princípio explícito da quebra de uma lei moral, que é o roubo e o furto.
A maldição no livro de Malaquias
Ainda se tem ainda que responder talvez uma objeção aparente quando se toca no livro de Malaquias. Pode-se perguntar: então aquele que sonega o dízimo está debaixo de Maldição como afirma Ml 3.9? Como podemos estar debaixo de maldição se nós fomos abençoados com toda sorte de bênçãos espirituais em Cristo Jesus e o próprio Cristo nos resgatou de toda maldição da Lei (Ef 1.3; Gl 3.13)?
Precisamos pensar que Malaquias traz uma linguagem e cultura do VT. Quando Malaquias fala em maldição, ele está trazendo a imagem de pecado. Ou seja, a palavra maldição no VT vem como sinônimo de transgressão da Lei moral. Isso é ensinado em várias passagens. A primeira está em Dt 22.21,22. Notem que a pessoa que pecasse seria pendurada no madeiro chamada de maldita. Em outra passagem, Moisés afirma que aquele que transgredisse as leis dos 10 mandamentos era considerado maldito (Dt 27.15-26). O que Malaquias está dizendo é que os israelitas estavam quebrando a Lei de Deus e trazendo conseqüência de maldição, ou seja, quebra da Lei moral. Realmente, o pecado é a transgressão da Lei (1Jo 3.4) e a transgressão da Lei é uma maldição porque quebra a aliança (Gl 3.10). Não se pode esquecer que Yahweh é um Deus pactual. A lei demonstra apenas que o homem quebrou esse pacto no Éden e que deveria esperar o Messias que cumprisse o pacto com perfeição. Portanto, tudo se resume na palavra pecado. Sabemos que se um cristão transgredir a lei de honrar os seus pais ele peca da mesma forma que qualquer ímpio (Dt 27.16). A diferença é que Cristo se tornou maldição em nosso lugar pagando toda a conseqüência da Lei moral (Gl 3.13,14), mas, mesmo assim, a palavra maldição para nós se torna um indicativo de pecado. Se levarmos em conta a maldição de Malaquias, deveríamos levar em conta também a maldição de Dt 27.15-26, pois tratam de leis morais que podemos transgredi-las no dia a dia. No entanto, a maldição demonstra um indicativo de pecado na linguagem do VT.
Outro grande questionamento para o dízimo é se ele tem base no NT ou se os apóstolos trataram como um mandamento que ultrapassasse até a nova era da igreja de Cristo. O que se questiona é por que os apóstolos não foram tão claros com respeito ao dízimo, já que este era para a igreja em todos os tempos? Por que a própria palavra dízimo é quase não usada no NT, com exceção da passagem de Hb 7 quando fala de uma passagem de Melquisedeque do VT?
Precisamos entender que não foi somente com o dízimo que os apóstolos agiram assim. Existem outros assuntos revelados e até mais sérios que os apóstolos praticamente não tratam e nem ordenam. Isso pode ser explicado devido a consciência apostólica que TODA ESCRITURA É INSPIRADA POR DEUS (2Tm 3.16).
Um dos exemplos do VT é a proibição do incesto. Os vários tipos de incesto foram proibidos no VT em Lv 18.6-17; porém, em nenhuma passagem do NT o incesto é tratado e proibido de forma plena e explícita pelos apóstolos. O que se tem é apenas uma passagem que Paulo fala aos coríntios que demonstra que foi erro e digno de disciplina quem possuiu a mulher de seu pai, mas não houve nenhuma proibição explícita em detalhes sobre isso por nenhum outro apóstolo (1Co 5.1-5). Mesmo assim, Paulo só tratou de um só caso, o de “possuir a mulher do seu pai”, mas ficaram todas as outras relações parentais reveladas do VT sem tratar. Afinal de contas, poderíamos dizer que só seria pecado somente o que Paulo tratou como pecado e não todas as reveladas no VT? Segundo o critério hermenêutico dos que advogam que o dízimo é somente para o VT teria que interpretar dessa forma os demais casos de incesto. No entanto, o VT não é sinônimo de obsoleto, mas deve ser interpretado de acordo com o NT, levando em conta que as leis morais sempre serão levadas em conta e as demais leis civis e cerimoniais foram cumpridas em Cristo. No entanto, como escrevemos acima, o dízimo veio antes da Lei cerimonial sendo um relacionamento de aliança e foi diretamente relacionado à lei do roubo.
Outro exemplo está no próprio NT acerca da cláusula excetiva de Jesus do divórcio (Mt 5.31,32; 19.8, 9). Nenhum apóstolo tratou desse assunto. Temos apenas Paulo tratando que se o marido incrédulo deixar a sua mulher crente e que ela se separasse não casasse (1Co 7.10-16). No entanto, Paulo não tocou na cláusula excetiva de Jesus sobre o divórcio. Claro que sabemos que Paulo não estava ignorando nem desfazendo o ensino do Senhor Jesus, mas complementando como uma pessoa inspirada pelo Espírito Santo. O que dizermos disso? Estaria a cláusula excetiva de Jesus somente para o tempo de Jesus, já que somente ele tratou desse assunto? Embora que em alguns grupos tenha essa interpretação, isso quebraria a unidade e o ensino de que “TODA ESCRITURA É INSPIRADA POR DEUS” ensinada por Paulo.
No caso do dízimo, apesar de que não houve um mandamento explícito chamando pelo nome no NT, os apóstolos demonstraram alguns princípios que demonstram que o dízimo é ainda para os nossos dias. Vejamos alguns textos:
a) Mateus 23.23
Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque dais o dízimo da hortelã, do endro e do cominho e tendes negligenciado os preceitos mais importantes da Lei: a justiça, a misericórdia e a fé; devíeis, porém, fazer estas coisas, sem omitir aquelas!
Esta passagem precisa ser levada em conta o contexto e o objetivo que os apóstolos escreveram os Evangelhos. Todos eles tinham a intenção de ensinar doutrinariamente a igreja entre os anos 50 e 80 da nossa era, se levarmos em conta a data bem recente dos primeiros evangelhos. Os evangelistas tinham como propósito, principalmente, doutrinário e teológico para defender a fé cristã. Cada passagem dos evangelhos foi escolhida e selecionada por eles para um objetivo. Por exemplo, não foi à toa que Mateus foi o que mais falou do Sermão da Montanha, já que a ênfase dele era cristãos vindo do judaísmo e seu objetivo foi mostrar a interpretação de Jesus para com a Lei moral de Deus. João escolheu sete milagres que demonstrassem a divindade do Filho de Deus. Portanto, os evangelistas era criteriosos e escreviam com objetivo.
Este texto impressiona porque Jesus está fazendo uma contundente crítica aos fariseus proclamando vários ais que os profetas do VT proclamaram da mesma forma. No entanto, Jesus fala do dízimo colocando-os no nível de princípios morais como a justiça, a misericórdia e a fé, embora que ele deixe claro que a justiça, a misericórdia e a fé são mais importantes. Jesus, então, finaliza dizendo que deveriam fazer estas coisas, sem omitir aquelas. Mateus usou o verbo grego (αφιεμι / aphiemi) traduzido para omitir que quer dizer deixar solto, livre. Portanto, Jesus estaria dizendo em outras palavras que é necessário praticar a justiça, a misericórdia e a fé sem negligenciar o dízimo. Jesus orientou que eles buscassem tudo isso, mas também não esquecessem de observar o uso do dízimo.
Essa expressão grega nessa advertência usada por Mateus acerca do dízimo é usada da mesma forma por Paulo em 1Co 7.11 para que o marido não se apartasse de sua esposa, demonstrando, assim, que Jesus estava tratando de um mandamento. O interessante é que isso não aconteceu com o Sábado nem com os alimentos. Jesus ao ensinar sobre o Sábado e sobre os alimentos, ele já demonstrava que eles eram transitórios.
A expressão grega de Mt 23.23 “ταυτα εδει ποιησαι κακεινα μη αφιεναι” demonstra uma profunda ligação entre as partes. Isto quer dizer que tanto é necessário e importante fazer “εδει ποιησαι”, como também não se deve negligenciar ou omitir aquelas (falando do dízimo) κακεινα μη αφιεναι. Paulo usa essa mesma expressão μη αφιεναι em 1Co 7.11. Ele escreve: “και ανδρα γυναικα μη αφιεναι”. Isso demonstra que o que Jesus falou era uma advertência com relação ao dízimo e que a igreja deveria observar. Para evitar esse contundente argumento, alguns dizem até que essa última parte não tenha sido escrito por Mateus, mas por um escriba legalista (veja William Hendriksen em seu comentário de Mateus-II pág. 464). Porém, não existe nenhuma crítica textual nessa parte do verso e esse argumento demonstra um total desespero de interpretação, pois o argumento de Jesus escrito por Mateus é confirmado em Lucas 11.42.
A expressão grega de Mt 23.23 “ταυτα εδει ποιησαι κακεινα μη αφιεναι” demonstra uma profunda ligação entre as partes. Isto quer dizer que tanto é necessário e importante fazer “εδει ποιησαι”, como também não se deve negligenciar ou omitir aquelas (falando do dízimo) κακεινα μη αφιεναι. Paulo usa essa mesma expressão μη αφιεναι em 1Co 7.11. Ele escreve: “και ανδρα γυναικα μη αφιεναι”. Isso demonstra que o que Jesus falou era uma advertência com relação ao dízimo e que a igreja deveria observar. Para evitar esse contundente argumento, alguns dizem até que essa última parte não tenha sido escrito por Mateus, mas por um escriba legalista (veja William Hendriksen em seu comentário de Mateus-II pág. 464). Porém, não existe nenhuma crítica textual nessa parte do verso e esse argumento demonstra um total desespero de interpretação, pois o argumento de Jesus escrito por Mateus é confirmado em Lucas 11.42.
Não sabeis vós que os que prestam serviços sagrados do próprio templo se alimentam? E quem serve ao altar do altar tira o seu sustento? Assim ordenou também o Senhor aos que pregam o evangelho que vivam do evangelho;
Esse texto é um dos textos bem didáticos sobre o dízimo, pois Paulo usa exatamente o serviço dos sacerdotes no VT. Paulo afirma que os que servem ao altar tira o seu sustento do próprio altar. Paulo está falando exatamente dos levitas e sacerdotes, pois os levitas e sacerdotes eram sustentados pelos dízimos do povo (Nm 18.22-26; Dt 12.19). O contexto é que Paulo estava sendo acusado de sobrecarregar os irmãos das igrejas. Ele responde usando várias metáforas como a do soldado que não vai à guerra a suas próprias custas, daquele que come da própria vinha e que bebe do leite do rebanho que apascenta (1Co 9.7). No entanto, Paulo fala do dízimo não mais como uma metáfora, mas como um modelo do VT. Por isso que ele colocou sobre o sacerdote separado das metáforas no v.13. O mais interessante é que ele faz uma ligação da expressão de Jesus em Lc 10.7 para a sua ilustração do sustento do sacerdote, mostrando que o Senhor ordenou o sustento do obreiro através dos dízimos. Portanto, Paulo está claramente ensinando nessa passagem o uso do dízimo, pois isso era a forma que os levitas e os sacerdotes eram sustentados.
Alguém pode argumentar que todos nós somos sacerdotes reais (1Pe 2.9). Portanto, o dízimo não se aplica mais para nós. Esse argumento não se sustenta nesse texto porque Paulo deixa claro que ele está se referindo aos obreiros e aqueles que trabalham na obra de Deus. Não é porque todos somos sacerdotes reais que não se use mais nenhum aspecto do sacerdócio para falar aos obreiros. A ênfase de Paulo aqui não é O ACESSO A DEUS, que somente os sacerdotes tinham, mas o SEU SUSTENTO. Realmente, em relação ao acesso e o privilégio de chegar à presença de Deus, todos nós somos sacerdotes reais, mas no sentido de sustento, nem todos vivem somente da obra de Deus, pois Paulo ensina a Timóteo que os presbíteros que se afadigam na Palavra são dignos de dobrados honorários (1Tm 5.17,18).
É o que Simon Kistemaker explicou quando comentou sobre esta passagem:
Assim mesmo, eles deveriam entender que as provisões para os sacerdotes e levitas são as mesmas para os pregadores do Evangelho. Não a forma, mas o princípio por trás dessas providências precisa ser observado. Não deveria haver diferença nenhuma.[2]
Em seu outro comentário de Hebreus 7.1-10 ele ainda escreve:
Na época do Antigo Testamento, o dízimo era usado para sustentar o sacerdote, o levita e as cerimônias religiosas no santuário. No NT, Jesus ensina que o trabalhador é digno de seu salário (Lc 10.7). Paulo repete essa regra, tanto indiretamente quanto diretamente quando ele escreve sobre o auxílio financeiro daqueles que proclamam o Evangelho (1Co 9.14; 1Tm 5.17,18).[4]
Embora que Kistemaker admita que no NT não haja nenhuma imposição ao dízimo explícita, ele reconhece na passagem de 1Co 9.14 que Paulo estava falando do sacerdote e do dízimo. Portanto, se Paulo estava falando do dízimo como sustento do sacerdote e usando-o como um paradigma de sustento para o obreiro, fica claro que Paulo está ensinando o princípio do dízimo.
O interessante ainda nessa passagem é a profunda relação que Paulo faz entre a passagem do VT “não amordaces o boi, quando pisa o trigo” com a expressão do Senhor Jesus “o trabalhador é digno de seu salário” (1Co 9.18). Isso demonstra que Paulo usa perfeitamente o VT como comprovação de seus argumentos do salário do obreiro e intensifica quando infere o dízimo para o sustento dos levitas e dos sacerdotes. Isso demonstra que Paulo entendeu que quando Jesus falou isso em Mt 10.10 e Lc 10.7 estava se referindo perfeitamente ao sustento do obreiro manifestado nos dízimos dos sacerdotes no VT.
Aliás, aqui são homens mortais os que recebem dízimos, porém ali, aquele de quem se testifica que vive.
Essa passagem se torna uma evidência de ensino do dízimo mostrando que as igrejas pagavam o dízimo na época. A epístola aos Hebreus foi escrita depois dos anos 70, depois que Jerusalém foi destruída e a religião judaica já estava em crise por causa da diáspora dos judeus.
Pela expressão podemos perceber a total intimidade da igreja em relação ao dízimo porque para que o autor usasse o dízimo como argumento de uma relação em aliança, a igreja deveria saber ou estar usando como prática na igreja local. A familiaridade da igreja com o dízimo foi que levou o autor a enfatizá-lo no episódio de Melquisedeque, já que alguns perderam o costume de congregar e fez o autor exortá-los a não abandonarem a congregação (Hb 10.25)
Notemos que o autor afirma que os homens “recebem dízimos”. O contexto é sobre Melquisedeque que recebeu o dízimo de Abraão sendo comparado a Cristo que foi sacerdote eterno. O autor para mostrar a grandeza daquele que recebeu o dízimo em Abraão, demonstra que “os homens mortais recebem dízimos aqui”. O verbo grego λαμβανουσιν / lambanousin está no presente do indicativo mostrando uma ação constante e presente. Poderíamos até traduzir como: “e aqui, homens mortais ESTÃO RECEBENDO dízimos, mas lá aquele que testifica que vive.
A expressão grega και ‘ωδε μεν δεκατας αποθνησκοντες ανθρωποι λαμβανουσιν demonstra que a ação dos homens mortais é de profunda ênfase presente. Tanto o verbo αποθνησκοντες no particípio presente como o verbo λαμβανουσιν no presente do indicativo ativo demonstram que o autor usa o exemplo de igrejas que estavam dando o dízimo. Talvez por trazerem uma influência judaica. De qualquer forma, o autor usa como algo normal e usa o argumento em favor da aliança entre Abraão em Melquisedeque.
A expressão grega και ‘ωδε μεν δεκατας αποθνησκοντες ανθρωποι λαμβανουσιν demonstra que a ação dos homens mortais é de profunda ênfase presente. Tanto o verbo αποθνησκοντες no particípio presente como o verbo λαμβανουσιν no presente do indicativo ativo demonstram que o autor usa o exemplo de igrejas que estavam dando o dízimo. Talvez por trazerem uma influência judaica. De qualquer forma, o autor usa como algo normal e usa o argumento em favor da aliança entre Abraão em Melquisedeque.
Essa expressão demonstra que as igrejas estavam dando o dízimo ainda naqueles dias. Podemos entender isso porque era uma igreja com profundas influências judaicas, mas o interessante é o que o autor usa o argumento e a prática dessas igrejas como comprovação do argumento da aliança entre Abraão e Melquisedeque afirmando que estavam dando dízimo. O autor em nenhum momento demonstrou a transitoriedade do dízimo, ao contrario, ele confirma como um relacionamento de aliança e que a igreja que “estava dando” o dízimo teria que entender o seu valor na revelação da aliança da graça.
Conclusão:
Diante de todo esse apanhado, precisamos analisar que o dízimo foi incentivado pelos apóstolos e pelo próprio Jesus. Se aconteceu assim, somente um motivo evitará de nós continuarmos a dar a décima parte de nosso sustento – avareza e egoísmo.
Alguns afirmam que não é obrigado ser a décima parte, mas uma oferta contínua e até regular na igreja para sustentar as coisas da igreja. Afirmam que se evitarmos falar na décima parte, as pessoas poderiam dar até mais de dez por cento. Porém, por que colocar outra porcentagem se Deus já instituiu a sua? Por acaso, queremos ser mais sábios que o próprio Deus? Quem dá uma oferta regular, dá segundo alguma porcentagem de seu sustento. Portanto, por que dar uma oferta com uma determinada porcentagem, sendo que Deus já instituiu a sua. Somente uma resposta nos vem: soberba? O homem prefere determinar a sua porcentagem porque ele fica com a glória. Se ele obedecer a Deus, a glória fica somente para Deus.
Deus não está interessado em sacrifício, mas em que se obedeça a sua Palavra (1Sm 15.22). Deus não está interessado se damos 80 ou 99% do nosso salário se isso vem com soberba em detrimento aos mandamentos de Deus. Jesus elogiou uma viúva pobre mais que os ricos que deixavam suas ofertas no gazofilácio. Isso porque ela deu de tudo que ela tinha, os demais, do que sobrava (MC 12.42-44). Portanto, Deus não está interessado em quantidade, mas em obediência.
Por isso, ele ordena aos LADRÕES: TRAZEI TODOS OS DÍZIMOS À CASA DO TESOURO (Ml 3.8-10).
[1] BROWN, Colin. O Novo Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento. São Paulo: Vida Nova, V. I: A-D, 1984, p. 676.
[2] KISTEMAKER, Simon. Comentário do Novo Testamento: 1 Coríntios. São Paulo: Cultura Cristã, 2004, p. 416.
[3] KISTEMAKER, Simon. Comentário do Novo Testamento: Hebreus. São Paulo: Cultura Cristã, 2004, p. 270.